Crítica: Zama

Crítica: Zama

Novo filme de Lucrecia Martel é uma experiência singular mas emocionalmente distante

Este filme fez parte da programação oficial da 41ªMostra Internacional de Cinema em São Paulo. Texto originalmente publicado em 23/10/2017. 

A não ser que seja versado na filmografia da argentina Lucrecia Martel ou esteja disposto a uma experiência bastante elusiva, Zama pode ser um filme praticamente impenetrável. É o que aconteceu no meu caso, mesmo já sabendo da monotonia de suas quase duas horas. Baseado no livro homônimo de Antonio DiBenedetto, Zama relata o fim do período em que Dom Diego de Zama esteve a serviço da coroa espanhola em terras paraguaias, aguardando seu retorno à esposa que se encontra em Buenos Aires.

Muito como o ótimo O Ornitólogo (que contou com o mesmo diretor de fotografia, Rui Poças), o longa de Martel apresenta uma construção paciente que gradualmente nos leva numa jornada cujos contornos são cada vez menos ordinários. O problema é que, diferente do filme do português João Pedro Rodrigues, a condução de Lucrecia Martel é tão discreta que chega a deixar alguns espectadores de fora da experiência logo de início, falhando em gerar imersão ou empatia pelos personagens e portanto diminuindo o impacto com os momentos finais, por sua vez, cativantes.

Uma pena, pois o ator Daniel Giménez Cacho encarna Zama com belas nuances, construindo a figura de um homem de seu tempo que perde suas esperanças em meio a uma burocracia que o devora pouco a pouco. Com ele, está a verdadeira alma do filme, tentando escapar sob o rigor muitas vezes excessivo de Martel. Representando a parcela brasileira do elenco, Matheus Nachtergaele também confere alma a seu misterioso personagem, que dá as caras apenas mais tarde no filme.

Visualmente, Zama é de encher os olhos, com uma direção de arte crível e suntuosa de Renata Pinheiro, registrada de maneira vivaz na fotografia de Poças. Quando o longa chega a seus trechos finais, em meio à mata, há uma vida ainda maior encontrada nas cores, o azul dos céus, o verde das folhagens e até mesmo os tons avermelhados dos indígenas adornados. Já os esparsos cortes da montadora Karen Harley ditam o ritmo da história de maneira comprometida a gerar um sentimento tão aflitivo de espera que o decorrer do longa chega a ser inebriante. Por fim, os acertados desenho e montagem de som também ajudam na atmosfera em sua superfície. Só faltou popular esse lindo canvas com um enredo igualmente interessante.

Talvez o material original conte com um registro histórico elaborado e um lirismo inspirado, mas em sua forma cinematográfica, Zama só diz a que veio em seus momentos finais, quando boa parcela dos espectadores talvez já tenha se desconectado da experiência. Dito isso, dado o renome de Lucrecia Martel no círculo cinéfilo e também múltiplas indicações a prêmios, a obra certamente terá seu público. Mas com um lento ritmo e o distanciamento emocional de seus personagens, é difícil recomendá-la para todos.


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Caio Lopes

Formado em Rádio, TV e Internet pela Faculdade Cásper Líbero (FCL). É redator no Cinematecando desde 2016.

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