42ª Mostra – Crítica: Uma Terra Imaginada

42ª Mostra – Crítica: Uma Terra Imaginada

Em busca de solo próprio

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Parte das areias de Singapura vêm da Malásia, Indonésia e outros países vizinhos. São mais ou menos como os imigrantes, que procuram no país asiático melhores condições de trabalho do que tinham nos respectivos lares. Este sentimento de deslocamento e da falta de um solo pátrio para chamar de seu envolvem Uma Terra Imaginada, longa dirigido pelo singapurense Yeo Siew Hua, vencedor do Leopardo de Ouro no Festival de Locarno 2018.

Em clima contemplativo, o filme começa com a chegada de dois policiais a um aterramento movimentado por dezenas de trabalhadores, de onde dois funcionários desapareceram. Nesta investigação repleta de mistérios, há um quê de cinema noir. O detetive Lok (Peter Yu) refaz os passos de Wang (Xiaoyi Liu), um dos empregados ausentes, com quem sente alguma identificação, a começar pelo fato de ambos sofrerem de insônia.

A solidão é outro fator que liga os personagens. Isto fica ainda mais claro quando o roteiro volta no tempo e se dispõe a contar o que aconteceu com Wang, e suas madrugadas passadas diante do computador de um cyber café. Sem conhecer ninguém muito profundamente desde que chegou da China, ele tem como válvula de escape as conversas com a atendente do local, Mindy (Luna Kwok), e a interação com um companheiro com quem divide partidas de games e desabafa sobre sua condição.

Assim como Arábia, um dos filmes brasileiros mais interessantes lançados este ano, o longa de Hua tece comentários sobre como a classe operária é tratada com descaso e de forma até mesmo opressiva pelo sistema, em nome de um suposto desenvolvimento. No caso de Uma Terra Imaginada, os patrões chegam até mesmo a reter os passaportes dos funcionários, impedindo-lhes de ir e vir sem seu consentimento. Assim, os indivíduos parecem pequenos diante das construções onde trabalham e dos poderes que agem sobre eles.

Pelo olhar para uma cultura cuja distância geográfica é imensamente maior do que a diferença entre a realidade social dos personagens e aquela vivida por tantos anônimos latino-americanos, o filme ganha relevância, mesmo que sua estética não tenha tantos atrativos, a parte à catártica sequência final, quando a dança serve como um ritual de renovação e resistência em frente ao cotidiano muitas vezes sem perspectiva de melhora.

Diego Olivares

Crítico de cinema, roteirista e diretor. Pós-graduado em Jornalismo Cultural. Além do Cinematecando, é colunista do Yahoo! Brasil

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