Crítica: A Guerra dos Sexos é uma aula sobre igualdade

Crítica: A Guerra dos Sexos é uma aula sobre igualdade

Novo filme de Emma Stone conta a história real dos tenistas Billie Jean King e Bobby Riggs

Batalha dos Sexos é o nome dado a partidas amistosas de tênis entre jogadores de sexos opostos. E a mais famosa delas aconteceu no dia 20 de setembro de 1973. Após ver a australiana Margaret Court perder para Bobby Riggs, um tenista aposentado de 55 anos que queria se manter nos holofotes com discursos machistas, Billie Jean King pede revanche. O resultado disso? Pelo menos 90 milhões de pessoas assistiram ao jogo de tênis que se tornou símbolo da luta contra o machismo naquela época. Essa história, importante não apenas para o mundo do tênis feminino, mas para todas as mulheres, virou filme. E não tinha como ser diferente: a sociedade está passando por uma fase em que as mulheres estão novamente lutando para ter voz. A verdade é que Guerra dos Sexos é um filme empoderador e uma verdadeira aula sobre feminismo e igualdade para quem estiver aberto para o assunto.

No longa, Emma Stone e Steve Carell incorporam os protagonistas Billie Jean King e Bobby Riggs. Recentemente vencedora do Oscar, Stone está incrível no papel e soube mostrar com perfeição as várias faces de Billie Jean: o seu amor pelo tênis, a sua força dentro e fora das quadras, a sua opinião forte, mas também a sua sensibilidade quando se trata de assuntos pessoais. Casada com o compreensível Larry King (Austin Stowell), a tenista se apaixona por sua cabeleireira, Marilyn (Andrea Riseborough) e Emma Stone consegue transmitir até mesmo no olhar toda a complexidade desse conflito interno de Billie Jean.

Steve Carell também está fantástico no papel, como já era de se esperar. Além de a caracterização ter ficado impressionante, parece que o ator nasceu para interpretar personagens excêntricos e exagerados. Aposentado, pai de dois filhos e viciado em fazer apostas, Bobby quer voltar aos holofotes e encontra uma maneira peculiar de conseguir isso. Com um discurso machista, o tenista começa a desafiar mulheres do mesmo esporte para provar a superioridade dos homens, ideia essa que o próprio Bobby não defende quando está longe das câmeras, mas que, de qualquer maneira, só ajuda a impedir que as mulheres conquistem o respeito que merecem. Apesar disso, Riggs não é o vilão de Guerra dos Sexos. Ele é um palhaço, um homem que não acredita em uma palavra do que diz (como a própria Billie Jean ressalta diversas vezes). Steve Carell também soube mostrar essas duas faces de seu personagem: o excêntrico Riggs que surge quando está na frente das câmeras e é chamado de porco chauvinista, e o Riggs que respeita a sua família e tenta parar de fazer apostas para não perder o amor de sua esposa.

O cenário machista dos anos 70 é também um grande protagonista desse filme. A opção da dupla de diretores, Jonathan Dayton e Valerie Faris, e do roteirista Simon Beaufoy foi certeira: por que não retratar o machismo da maneira mais direta e escrachada possível? O filme opta em deixar claro que existem homens, principalmente os poderosos empresários, que defendem que eles são biologicamente superiores às mulheres e, por isso, elas merecem ganhar menos. A Guerra dos Sexos propõe uma reflexão interessante: será que o mundo de fato progrediu nos últimos anos? O machismo exposto dos anos 70 não se difere muito do que as mulheres ainda passam em 2017. E não podemos esquecer que Donald Trump à frente dos Estados Unidos é um retrocesso imenso – e é isso que faz o filme de época parecer tão atual. Alguns homens estão, sem medo, vestindo a camisa de ‘macho chauvinista’ e saindo por aí com orgulho. O que o filme joga na nossa cara é basicamente o seguinte: estamos falando de 1973, mas poderia ser 2017.

Provavelmente, a única coisa que evidencia os 44 anos de diferença seja a fotografia. Todo o cenário e a caracterização dos personagens foram cautelosamente pensados. Mas a obra também tem os seus pontos negativos. Ao final de A Guerra dos Sexos, é um pouco difícil saber exatamente o que o filme é. Não é comédia, nem drama. E, em alguns momentos, a história esfria. Na primeira metade, muitos conflitos são expostos de uma vez só para o público: a falta de respeito para com as mulheres, a homossexualidade da protagonista até então mantida em segredo. Mas tudo isso fica em segundo plano na segunda metade do filme e os conflitos passam a ser desenvolvidos muito lentamente. Às vezes, cansa. Porém, o longa não deixa em nenhum momento de ter boas cenas. Ponto positivo para a sutileza e naturalidade na forma como o relacionamento de Marilyn e Billie Jean é desenvolvido. Desde a forma como ele começa até as últimas cenas.

A Guerra dos Sexos é um filme que propõe diversos debates diferentes, por mais que alguns assuntos não sejam tão óbvios (cabe ao público fazer outras ligações). Mais legal ainda é saber que essa é uma história real, que Billie Jean King foi uma das responsáveis por mudar o rumo do tênis feminino e também levantou a bandeira feminista. A carga emocional da obra é grande. Mesmo que você já conheça essa história, vale a pena ir ao cinema.

Jaquelini Cornachioni