Crítica: Rei Arthur – A Lenda da Espada

Crítica: Rei Arthur – A Lenda da Espada

O diretor inglês Guy Ritchie, de quarenta e oito anos, tem feito um nome de sucesso considerável através de seus projetos, principalmente entre o público. Assim, é com entusiasmo que se espera um de seus filmes. Com estreia para esta quinta-feira (18), Rei Arthur – A Lenda da Espada é a nova empreitada estilística de Guy Ritchie, que mostra (obs.: sim, nada de ‘conta’ ou ‘narra’) a vida de Arthur (Charlie Hunnam), um jovem das ruas da cidade de Londinium que desconhece suas origens até o momento em que retira da pedra a espada Excalibur, e a partir disso deverá enfrentar seus medos e dominar o poder da espada para, enfim, tirar do poder o homem que matou seus pais, Vortigern (Jude Law).

Se Rei Arthur – A Lenda da Espada faz jus ao gosto geral do público jovem atual, ele falha ao abdicar de qualquer forma de encantamento narrativo. Um filme acelerado (obs.: acelerado e dinâmico são formas diferentes) e intenso, mas que não chega perto de qualquer clímax em qualquer um dos atos.

O início do filme, com toda sua “dramaticidade” (notar aspas!) consegue até fazer lembrar a abertura de Batman V Superman: A Origem da Justiça, coincidentemente, também da Warner Bros. Pictures: temos câmera lenta, trilha colossal, fotografia escurecida, etc. Pensa-se, com estes elementos, que pode existir uma grande abertura para um filme. E de fato existiria, se este não abusasse tanto destes elementos ao longo de pouco mais de duas horas de filme. Ao fazer isso, mesmo uma grandiosa apresentação entra na conta do restante do filme, tornando o todo genérico.

O leitor desta review pode pensar que este redator é um dos detratores de Guy Ritchie. Não é o caso. Na realidade, seus filmes mais recentes e conhecidos do grande público são todos bem agradáveis e de bom entretenimento, principalmente quando, à sua maneira, retratou as aventuras misteriosas do detetive mais conhecido no mundo, Sherlock Holmes, no filme homônimo de 2009 e em sua continuação, Sherlock Holmes: O Jogo de Sombras, de 2011. Seu filme anterior a este lançamento, O Agente da U.N.C.L.E., apesar da fraca bilheteria, também terminou por ser um trabalho de apreço de Guy Ritchie, apenas um pouco mais ‘blasé’ (obs.: blasé não é uma referência negativa aqui).

Este diretor sempre se equilibrou entre estilo, dinâmica e entretenimento. Em Rei Arthur – A Lenda da Espada, ele só acertou no quesito estilo. Nos piores momentos do filme é possível comparar seu estilo de direção aos piores (sim, existem momentos raros de qualidade!) do diretor Michael Bay, principalmente pelo ritmo aceleradíssimo, como se o filme tivesse disputando medalha de ouro na categoria 100 metros rasos, com duas montagens, ainda na primeira parte do filme (primeira, logo após créditos iniciais, e segunda, treinamento em ‘Terra das Sombras’) usadas como que querendo resumir fatos, e não criando qualquer forma de desenvolvimento para arco dramático. Porém, este mesmo estilo de montagem, quando usado (também duas vezes) para gerar algum tipo de entretenimento através de humor, é uma forma de linguagem e consegue tirar uma ou outra risadinha bem leve (obs.: essas cenas lembram muito os diálogos entre Paul Rudd e Michael Peña em Homem-Formiga).

Além deste macete de edição mal utilizado (lembrando o ‘fast forward’ usado em fitas VHS), outro detalhe que vale mencionar é o design fotográfico do filme. Se o 3D não é dos mais memoráveis, também não deixa de cumprir suas missões, tanto de entretenimento (espadas na direção da plateia), como a real principal função do 3D para cinema, que é dar profundidade de campo as cenas. Nisso, Rei Arthur – A Lenda da Espada cumpre suas funções. A fotografia de tom sisudo tem sua beleza, mas os movimentos de câmera, devido a esse ritmo exageradamente frenético, ao mesmo tempo que mergulham o filme em uma ação constante (uma mistura de Michael Bay e Paul Greengrass), tiram suas possibilidades de ‘ganchos’ narrativos para criar atmosferas de real interesse, e consequentemente, conexão para com o público. No terceiro ato, temos duas cenas de luta que mesmo visualmente atrativas, ambas lembram mais design para games, do que cinema. Ótimo uso de efeitos visuais, mas longe de ser cinema. Parece videogame, e para isso, melhor um ‘joystick’ em mãos do que pipoca.

A trilha sonora colossal instaurada desde os princípios do filme se mantém incessante até o final (claro que modulada de acordo com o tom das cenas). Isoladamente, o trabalho musical de Daniel Pemberton é o mais digno de elogios, com uma mistura orquestrada, fazendo uso de instrumentos associados à era medieval, e música eletrônica pesada (sons graves). Todavia, a fragilidade narrativa faz com que este uso da música soe abusivo, como uma forma de truque, enganando com sua grandiloquência berrante.

Falando em fragilidade narrativa, o roteiro (preguiçoso!) deste filme é cheio de montagens, algumas destas usando de ‘flashbacks’ para entregar as motivações da personagem-título e da história. Isso torna o filme uma ‘mistureba’ de elementos: animais gigantes, guardas reais com pitbulls (!), linguajar popular (e com sotaque australiano), e por aí vai…

O elenco: sem brilhos. Jude Law, que interpreta o antagonista tirânico Vortigern, tem duas boas cenas (estas, um dos raros momentos de diálogo sem aceleração) mas cai na irregularidade.

Definitivamente, apenas um ator fez um bom trabalho: o herói da história, interpretado com carisma já habitual de Charlie Hunnam. O ‘timing’ correto para humor, aliado à uma canastrice charmosa, geralmente alcançam a plateia. É possível afirmar que, mesmo em um filme enfraquecido, um bom protagonista pode ser suficiente para manter a sua curiosidade na história, ou no próprio destino (vide Perdido em Marte). Charlie Hunnam, aparentemente, tem isso de sobra. Ajuda muito também o seu visual (propositadamente elaborado) ‘hipster lumberjack’ que frequenta a ‘feira medieval’. Não duvide ouvir, na sessão do filme, alguém falar alto “multiplica, Senhor!” quando Charlie Hunnam aparecer na grande tela.

Um detalhe (na verdade, um diálogo) nas cenas finais de Rei Arthur – A Lenda da Espada faz uma menção ao estado atual da Inglaterra e Reino Unido pós-Brexit, quando se é questionado se há espaço para o vizinho. E o filme trata de responder que ‘sim’, nesta frase proferida pelo protagonista da história, – ‘Por que ter inimigos quando se pode ter amigos?’ – na conversa entre Arthur, agora rei, e os vikings. Pena que um tema como este fique completamente perdido e isolado neste ‘carnaval’ sonoro e visual de Guy Ritchie.

No dia a dia, dizem aquela frase já muito repetida: ‘Às vezes na vida, precisamos dar um passo para trás, para dar dois para frente’. Sem entrar na discussão do valor ou contexto dessa frase e apenas tomando-a como uma verdade, espero que Rei Arthur – A Lenda da Espada tenha sido este passo para trás para que seus próximos projetos, seja a versão live-action de Aladdin ou a continuação de O Agente da U.N.C.L.E., possam ser considerados como dois passos à frente em sua carreira.

FICHA TÉCNICA
Título Original: King Arthur: Legend of the Sword
Direção: Guy Ritchie
Produção: Warner Bros. Pictures; Safehouse Pictures; Ritchie/Wigram Productions; Village Roadshow Pictures; Weed Road Pictures
Roteiro: Guy Ritchie; Lionel Wigram e Joby Harold
Gênero: Fantasia
Duração: 126 minutos
Classificação: 14 anos
Elenco: Charlie Hunnam (Rei Arthur); Àstrid Bergès-Frisbey (A Maga); Djimon Hounsou (Sir Bedivere); Aidan Gillen (Goosefat Bill Wilson); Jude Law (Vortigern); Eric Bana (Uther Pendragon)

Entrevistamos Charlie Hunnam para o filme Rei Arthur! Confira:

Alexis Thunderduck

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