O que Her e Black Mirror têm a ver com relacionamentos?

O que Her e Black Mirror têm a ver com relacionamentos?

Em 2013, Her era um filme muito comentado por críticos e também em redes sociais, mas foi só esse ano que eu tive a curiosidade de assistir ao longa de Spike Jonze. Eu já sabia a história e tinha ideia do que aconteceria com Theodore, protagonista que se apaixona por uma inteligência artificial criada a partir de seus gostos e personalidade. Serviços como esse soam familiar para nós desde aquela época. A ideia de ter ao seu lado uma namorada virtual, moldada a partir de seu interesse é uma realidade principalmente para os asiáticos. No meio do ano passado, cheguei a ver uma matéria sobre uma esposa virtual, que nada mais é do que um holograma dentro de uma caixa de vidro que cuida e interage com o seu “companheiro”. Eu sei que eu disse que essa é uma realidade principalmente entre os asiáticos, mas isso não significa que pessoas de outros países não procurem pelo mesmo serviço.

Tudo isso me fez pensar sobre como as pessoas estão se relacionando hoje em dia e o que as leva a trocar um companheiro real por um virtual. A timidez, a insegurança e o medo da solidão foram as primeiras hipóteses que surgiram na minha cabeça. Facebook, Twitter, Instagram: todas essas redes sociais nos possibilitam interagir com pessoas de diversos lugares no mundo e isso é simplesmente incrível quando feito com responsabilidade, claro. Quantos romances já não começaram dessa maneira e duram até hoje? Mas, ao mesmo tempo, as redes sociais geram níveis de insegurança maiores e, às vezes, relacionamentos superficiais que são confundidos com relacionamentos sólidos. É basicamente o que diz Bauman em sua obra de maior sucesso, Amor Líquido: Nada é feito para durar. Talvez as pessoas também estejam cada vez mais introspectivas no mundo real, com medo do outro ou com medo de mostrar quem realmente são. É fato que, em muitos momentos, soa mais fácil falar sobre certos assuntos na internet do que cara a cara, independente do motivo que a pessoa tenha para isso.

Depois, pensei em como é difícil aceitar ser contrariado dentro de um namoro ou casamento. Talvez a palavra não seja difícil, mas: cansativo. Então, é cansativo (e ao mesmo tempo maravilhoso) compartilhar ideias, sonhos e objetivos. E chega a ser exaustivo entender que você precisa ser flexível – e menos orgulhoso – em certos momentos. Um namoro, por exemplo, é como um bichinho que precisa ser alimentado, bem cuidado e muito bem tratado para não adoecer. Tudo isso é muito clichê, mas é real. E muitas pessoas cansaram de passar por esse “processo”. Atire a primeira pedra quem nunca fantasiou o homem ou a mulher perfeita e eu duvido que essa fantasia inclua diferenças de pontos de vista ou desentendimentos. Já perdi as contas de quantas vezes me decepcionei, seja com namoros ou amizades e disse: nunca mais vou confiar em alguém de novo, nunca mais vou desabafar com pessoas. Todos esses “nunca mais” que falamos ao longo da vida são o que, possivelmente, acabam nos bloqueando mais tarde. Mas toda essa decepção é inevitável.

Recentemente, Black Mirror abordou o tema em um dos meus episódios favoritos da série: Be Right Back. Nele, a protagonista Martha começa a usar um serviço online que reproduz a personalidade de seu falecido namorado, baseando-se em dados e posts nas redes sociais. O intrigante desse episódio (alerta de spoiler!) é que, com o tempo, a personagem se irrita com o fato de o serviço não a confrontá-la com opiniões diferentes e reações inusitadas (como acontece em qualquer relacionamento real saudável) e chega a surtar ao entender que aquilo não vai ser o suficiente para sempre.

É surreal observar que estamos caminhando para um mundo em que tudo pode ser resolvido virtualmente – até mesmo a sua vontade de se relacionar com alguém que seja perfeito e pense exatamente como você. Alguém que, no mundo físico, não existe!

Jaquelini Cornachioni