Black Mirror: Nosedive também é sobre amor próprio

Black Mirror: Nosedive também é sobre amor próprio

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Se a tecnologia é uma droga, quais são os seus efeitos colaterais?
É partindo dessa premissa que Charlie Brooker criou a série Black Mirror, que desde a sua primeira temporada aborda a forma como nós vivemos hoje.  No dia 22 de outubro, a Netflix disponibilizou os seis episódios da terceira temporada e, dentre tantas histórias incríveis, Nosedive foi a que mais chamou a minha atenção. Não digo isso pelo roteiro ou pelos atores. Nosedive se aproxima cruelmente da nossa realidade, por mais que Black Mirror mostre tudo de uma maneira futurista. A impressão que dá assistindo ao episódio é que se já não estamos vivendo como escravos das redes sociais nesse exato momento, é para essa forma de viver que estamos caminhando.

A série foi criada para incomodar

Quando assistimos Black Mirror, é normal sentirmos alguns efeitos colaterais como angústia, ansiedade e aquela vontade absurda de, por exemplo, colocar uma fita na frente da WebCam. A sensação que fica é a de que estamos em um reality show: nós não sabemos, mas pode ser que alguém esteja nos observando agora. Paranoias à parte, a série foi criada com a finalidade de nos deixar incomodados. Afinal, o incômodo causa reflexão. E Nosedive nos faz pensar em como usamos as redes sociais. Só esse episódio já é o suficiente para nos causar um verdadeiro embrulho no estômago. E olha que ele é apenas o primeiro.

Em Nosedive, o desempenho das pessoas nas redes sociais gera uma nota, que é essencial para o papel delas dentro da sociedade. Com nota alta, é possível alcançar certos privilégios, enquanto o contrário só afasta as oportunidades. O clima do episódio é muito futurista: nele, uma pessoa pode até mesmo avaliar a outra após algumas palavras trocadas. Na história, acompanhamos a jornada da protagonista para conseguir a popularidade e os ganhos que tanto deseja. Vale dizer que tudo isso acontece por um aplicativo que, coincidência ou não (obviamente não), é igual ao Instagram. Isso porque é no Instagram que mais avaliamos as pessoas.

A ideia do texto não é falar mal do Instagram ou de qualquer outra rede social. Longe disso. Acho incrível poder compartilhar fotos de momentos que eu adoro lembrar e, não vou ser hipócrita, gosto de receber comentários positivos, elogios e amo quando pessoas que eu admiro curtem as minhas fotos, seja uma selfie ou um registro do pôr do sol. E, claro, também acho maravilhoso poder ver o que as pessoas que eu gosto compartilham. Mas, e quando tudo isso vira uma grande obsessão? É exatamente esse o ponto que Nosedive aborda. Na tentativa de conseguirmos mais seguidores, como se isso fosse a única finalidade em nossas vidas, nos moldamos conforme os padrões. De repente, todo mundo é muito igual e há numa briga intensa por likes.

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O que eu quero dizer é: nós já avaliamos as pessoas todos os dias pelo o que elas mostram ser, sem tentarmos ao menos conhecê-las de maneira um pouco mais profunda. É tudo na base da aparência. Se tal garota é gorda demais para os padrões, ela não é vista com bons olhos. Para alguns, ela é menos atraente. Logo, menos likes na selfie (e se para essa garota em questão os likes são importantes, surge a frustração). Isso acontece igualmente com o restante das minorias ou com quem simplesmente não liga para o que os outros querem ver. Essa nota que Nosedive mostra como algo obrigatório para os personagens é exatamente a reputação que buscamos alcançar através dos likes das nossas fotos no Instagram, Facebook, Twitter, que seja. O episódio não pede que a gente pare com o hábito de compartilhar o que gostamos, mas é um alerta descarado sobre os cuidados que precisamos ter para não nos tornarmos obsessivos com esse mundo virtual, que não pode afetar tanto assim o mundo real. Mas atire a primeira pedra quem nunca se perguntou o motivo de uma pessoa que gostava tanto ter dado unfollow (Será que eu sou feia? Será que não sou interessante?). Chega a ser engraçado como as redes sociais aproximam as pessoas e, da mesma maneira, possuem o poder de distanciar e criar abismos entre elas.

Se você ainda não assistiu Nosedive, vale a pena. O nó na garganta após o episódio está garantido. Mas essa também é uma maneira de repensar se você é realmente você nas redes sociais ou só uma cópia dos padrões de beleza e comportamento que analisa por aí – e avalia com 5 estrelas. Muito mais do que um episódio sobre o perigo das redes sociais em excesso: é sobre amor próprio também.

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Jaquelini Cornachioni

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