Crítica: Animais Fantásticos – Os Crimes de Grindelwald

Crítica: Animais Fantásticos – Os Crimes de Grindelwald

Quando o passado mexe com o futuro já conhecido

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Como manter o público cativo interessado e entregar uma história que se feche em si mesma enquanto longa-metragem, mas, como uma narrativa episódica, ao mesmo tempo prepare o terreno para acontecimentos ainda maiores que devem vir nos próximos capítulos? Este foi por muito tempo o desafio da franquia literária Harry Potter, e agora se estende também à sua derivada nos cinemas, Animais Fantásticos.

Sendo a segunda parte do total já anunciado de cinco longas-metragens iniciados em 2016 com Animais Fantásticos e Onde Habitam, a continuação deixa muitas pontas soltas a serem resolvidas daqui por diante, mas tem o mérito de conseguir aprofundar os conflitos entre feiticeiros radicais e pacíficos, central para o desenvolvimento da trama. O primeiro grupo, liderado pelo vilão Grindelwald (Johnny Depp), acredita que a raça humana deve ser dominada pelos bruxos. Já os outros creem na manutenção da paz que há 100 anos reina na relação entre os dois universos.

Animais Fantásticos – Os Crimes de Grindelwald começa pouco depois de onde parou o anterior. Por isso, é fundamental tê-lo na cabeça para seguir o novo enredo.

Em uma sequência inicial que tem ecos das cenas de ação aérea de filmes como Missão: Impossível, o personagem de Depp escapa dos guardiões do Ministério da Magia e se vê à solta novamente. Ele continua disposto a tudo para ter como aliado o jovem de origem misteriosa Credence Barebone (Ezra Miller), que por sua vez encara a própria jornada para entender de onde veio, indo até Paris em busca de pistas.

Enquanto isso, Newt Scamander (Eddie Redmayne) responde pelas estripulias que aprontou em Nova York. No entanto, um chamado de Dumbledore (que agora aparece rejuvenescido, interpretado por Jude Law), faz com que ele tenha a missão de conter Grindewald.

Fãs do Universo Harry Potter irão se deliciar com as passagens que voltam a utilizar Hogwarts como cenário, incluindo aulas do então professor Dumbledore a Newt e Leta Lestrange ainda crianças, antes de serem vividos por Redmayne e Zoë Kravitz. O tão polêmico relacionamento amoroso homossexual entre Dumbledore e Grindelwald é citado de forma sutil, quando o futuro diretor da Escola de Magia diz que eles eram “mais que irmãos”.

Já uma revelação que surge pouco antes dos créditos finais pode desagradar parte deste público, ao mexer com verdades tidas como estabelecidas até então. Se isso é uma jogada apelativa de J.K. Rowling e do diretor David Yates para gerar interesse aos próximos filmes, será necessário esperar um pouco mais para ver.

Os efeitos especiais, figurinos e os tais animais fantásticos que dão título à franquia aparecem com o habitual show de técnica que uma superprodução deste calibre pode comprar. Ao lado da imensidão de tramas paralelas da história, como o triângulo amoroso entre Newt, Leta e Tina Goldstein (Katherine Waterston) ou o romance condenado entre Jacob Kowalski (Dan Fogler) e Queenie (Alison Sudol), a sensação por vezes é de muita informação e pouco foco em uma mensagem capaz de costurar tudo.

O filme tem seus melhores momentos quando investe nas alegorias. A postura hesitante e quase passiva de Newt em relação a como agir diante de Grindelwald é justificada quando outra personagem o define como alguém que “nunca encontrou um monstro que não pudesse amar”. O discurso do vilão no clímax, por sua vez, é tão ardiloso, manipulativo e persuasivo quanto os de políticos de extrema direita que ganham espaço em diversos países do mundo. A forma com a qual utiliza o medo de quem pensa diferente para referendar suas ações violentas é cruel, o modo como usa um vislumbre da Segunda Guerra Mundial, algo que virá a acontecer anos mais tarde na linha do tempo, para provar a brutalidade dos humanos “não-mágicos” se prova um argumento eficiente.

Da mesma forma em que J.K. Rowling guiou uma geração para passar da infância à adolescência na virada do milênio, agora a autora e também roteirista parece disposta a fornecer aos jovens adultos que cresceram lendo seus livros analogias para entender um mundo real em permanente desacordo.

Diego Olivares

Crítico de cinema, roteirista e diretor. Pós-graduado em Jornalismo Cultural. Além do Cinematecando, é colunista do Yahoo! Brasil