Crítica: Missão: Impossível – Efeito Fallout

Crítica: Missão: Impossível – Efeito Fallout

Cruise/McQuarrie e os caminhos da fé

Imagem do filme 'Missão: Impossível - Efeito Fallout'

“Louvado seja Nosso Senhor Jes … Tom Cruise”. Não é exagero dizer que, para seus adoradores e seguidores mais fervorosos, o astro seja como algum tipo de Messias. E o diretor Christopher McQuarrie parece não pensar diferente destes em Missão: Impossível – Efeito Fallout.

O recém-lançado capítulo da saga de sucesso nos cinemas começa com o agente da IMF Ethan Hunt (Tom Cruise) em uma nova missão. Porém, desta vez, as coisas não saíram como o planejado. Agora, Hunt e sua equipe correm atrás do prejuízo e buscam acertar as contas com os erros do passado, e impedir uma catástrofe global.

Christopher McQuarrie, único diretor a conseguir fazer mais de um filme na franquia, continuou o ótimo trabalho iniciado em Missão: Impossível – Nação Secreta (2015) – que ainda segue o melhor filme desta cinessérie. Efeito Fallout ganhou contornos mais épicos que seu antecessor – a mastodôntica trilha sonora de Lorne Balfe, que parece um mix de Jóhann Jóhannsson e Hans Zimmer, não deixa mentir.

McQuarrie fez questão de englobar elementos de todos os filmes anteriores, mostrando também estar antenado com as mudanças da perspectiva de como o público do século XXI vê o audiovisual hoje em dia: mais como um espectador ativo. Ao adicionar estas características dos outros filmes, o cineasta convida o público a “participar” de um jogo de caça às referências, trabalhando sua mente durante e após a sessão na busca destes elementos já visitados (Steven Spielberg fez isso muito bem em Jogador Nº1).

Portanto, temos algo de Missão: Impossível (1996), dirigido por Brian De Palma, até Missão: Impossível – Protocolo Fantasma (2011), de Brad Bird. Mesmo o injustiçado Missão: Impossível – 2 (2000), de John Woo, tem sua vez em Efeito Fallout – por dois momentos: em Paris e no final, mas com outro meio de transporte.

O roteiro de McQuarrie no longa anterior, Nação Secreta, é mais limpo que em Efeito Fallout, que é mais carregado – além de retornar certos pontos do filme de 2015. Todavia, isto não se mostrou um problema para o cineasta. Grandiosidade e caráter épico são adjetivos que definem a alma destes filmes; e McQuarrie não segurou a fome, seja pelo enredo ou fotografia. Demonstrou segurança e compreendeu bem o espírito criativo que começou com De Palma na cena do trem-bala no túnel, o clímax do primeiro filme.

A cinematografia de Rob Hardy têm duas funções em Efeito Fallout. A primeira é agir como o coração e cabeça de seu protagonista. Em outras palavras: exercer uma fusão com Tom Cruise, principalmente nas vertiginosas cenas de ação. A segunda é contribuir (junto da montagem) na transição no ritmo do filme, esquematizando composições de cena que podem ser o início ou o final de uma ação, oferecendo um equilíbrio geral à fluência necessária em obras deste gênero. O cumprimento destas funções torna o longa dinâmico, eletrizante e agradável.

No elenco, algumas novas adições, sendo uma destas, boa surpresa: Vanessa Kirby, com uma misteriosa performance que balança entre o deboche e a inocência. Henry Cavill interpreta o antagonista da história com o mínimo de competência, mas toneladas de plutônio a menos que o ótimo e ameaçador (como um réptil), Sean Harris – de volta como Solomon Lane. Quem também retorna é Rebecca Ferguson como a dúbia agente Ilsa Faust. Ferguson conseguiu, por vezes, roubar a cena de Tom Cruise em Nação Secreta e sua volta parecia uma escolha óbvia, mas nem por isso menos acertada.

Por último e mais importante: o herói. Aqui, no sentido mais literal possível, vide a referência à Odisseia de Ulisses, no falso-livro que na verdade carrega um dispositivo tecnológico com a função de repassar a missão ao agente Ethan Hunt.

Curiosamente harmônico ou elaboradamente pretensioso, seja como for, a dupla Tom Cruise e Christopher McQuarrie soube tirar proveito de algumas situações reais (o ator é cientologista), que ajudaram a dar muito mais corpo a Efeito Fallout. Surpreendentemente, este é um filme sobre fé, e seus caminhos. Não apenas a fé dogmática e disciplinar, dos preceitos da Igreja (com uma cena bem explícita de perseguição em Londres), mas a fé mística, da crença na redenção, e na superação. E esta é entregue através de ações (Ethan Hunt) e palavras (Luther Stickell, interpretado por Ving Rhames).

É fácil traçar um paralelo no mundo polarizado de hoje, onde também é banal afirmar que parece uma luta de fanatismo contra fanatismo. Mas o diferencial nesse cenário é alguém como Ethan Hunt. O agente da IMF, antes de acreditar no todo, considera o indivíduo. Para Hunt, a ideia é ter quantos mais puder ao seu lado no pôr-do-sol, pois este sabe o pesar que o sofrimento trouxe pelas escolhas que fez.

Talvez Missão: Impossível – Efeito Fallout seja a maneira que Tom Cruise e Christopher McQuarrie encontraram de dizer que, no meio de toda a gritaria, de todo ressentimento, e de tanto medo… para igualar e bater de frente com isso, que se faça como age Luther Stickell em um dos momentos mais dramáticos do longa: sem poder ver ou ouvir, mas ainda acreditando.

Alexis Thunderduck