Crítica: O Nevoeiro (1ª temporada)

Crítica: O Nevoeiro (1ª temporada)

Muitas histórias, livros e contos de Stephen King já foram adaptados para o cinema, mas pela primeira vez o conto O Nevoeiro do autor serviu como inspiração para um roteiro em forma de seriado. Antes de ver a série, é normal o expectador criar algumas expectativas, ainda mais uma vez que o conto já foi adaptado para o cinema, no suspense homônimo de 2007. Como esperado por muitos, a série original da Netflix não conseguiu atingir o mesmo sucesso do filme e realmente deixa muito a desejar na construção de seus personagens e seus arcos.

Uma névoa misteriosa envolve lentamente a cidade de Bridgton, no Maine, criando uma barreira de visibilidade quase impenetrável. Os moradores da cidade logo percebem que situação é ainda mais precária quando descobrem que, escondido dentro da névoa, existem monstros de vários tipos tamanhos que atacam e matam qualquer coisa que se mova.

Com um início calmo, a série pretende apresentar todos seus personagens principais e secundários, que são realmente muitos. Um formato de série para um conto tão pequeno é sempre um motivo para ficarmos com um pé atrás, pois, no caso, uma simples história de pessoas presas em um supermercado seria o suficiente para prender o expectador durante vários episódios? Aparentemente, os criadores e roteiristas já pensaram nisso antes de tudo e resolveram criar mais arcos dentro da premissa inicial. Vemos então, de início, diversos personagens se abrigando em diferentes locais como uma igreja, uma delegacia e o clássico supermercado.

Um mérito do roteiro (e talvez o único) se faz ao refletir bem o início e o fim das relações humanas, mostrando no começo os personagens tentando sobreviver, racionando comida, debatendo sobre o que está acontecendo e buscando um sentido para explicar a misteriosa névoa que assombra toda a cidade, e por fim o que os instintos de sobrevivência são capazes de provocar numa convivência em grupo. A transição da bondade para o egoísmo é bem trabalhada, deixando o público interessado em como o arco de cada personagem vai se resolver.

Porém, o roteiro escorrega feio ao caracterizar a maioria de seus personagens, que, mesmo em formato de série (onde há tempo para tal), acabou explorando menos o desenvolvimento de personagens do que o próprio filme de duas horas. Embora alguns sejam bem construídos com um passado e um conflito estimulantes, o que mais decepciona é a ausência de justificativa para os atos dos personagens. Quando o desespero toma conta dos ambientes, muitas pessoas começam a cometer ações absurdas, com pouca ou nenhuma razão, o que cria apenas uma desastrosa confusão de inverossimilhança, situações cômicas que na verdade deveriam ser tensas e cenas desnecessárias.

O que diminui a produção são os próprios atores, que, com pequenas exceções, não conseguem carregar o peso dramático que as cenas exigem, entregando expressões falsas ou mesmo a falta de expressão, no caso de alguns. Conforme a temporada se aproxima ao fim e surgem algumas revelações e ocasiões inesperadas, o público já cria a certeza de que a série pretende se estender por pelo menos mais uma temporada, o que se confirma após o gancho da última cena.

Com direção e montagem satisfatória, O Nevoeiro, no geral, tem boa direção de arte e ótimos efeitos visuais, que talvez sejam o carro-chefe da produção. A história em si inclui muitos ingredientes que simplesmente não descem pela garganta do expectador, ou pelo menos na minha não desceu, mas com um pouquinho de esforço ainda é possível enxergar um bom entretenimento de ação e suspense. Os fãs do conto e do filme podem se sentir atraídos pela série e, com certeza, o sentimento de nostalgia vai tomar conta da maratona. Só é preciso tentar não ser exigente com o falso drama da série, que funciona apenas algumas das inúmeras vezes que tenta forçadamente criar um clima de comoção ou revolta.

O Nevoeiro se inclui na pequena lista de obras medianas que a Netflix lançou em suas últimas semanas. Filmes como Onde Está Segunda e a adaptação Death Note, além da série Os Defensores, nos deixam a impressão que a distribuidora pode estar se encontrando em uma pequena má fase. Só nos resta torcer para que essa fase não dure por muito tempo, afinal todos nós amamos os lançamentos desse incrível e popular serviço de streaming.

João Pedro Accinelli

Amante do cinema desde a infância, encontrou sua paixão pelo horror durante a adolescência e até hoje se considera um aventureiro dos subgêneros. Formado em Cinema e Audiovisual, é idealizador do CurtaBR e co-fundador da 2Copos Produções. Redator do Cinematecando desde 2016, e do RdM desde 2019.

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