Crítica: Um Pequeno Favor

Crítica: Um Pequeno Favor

Suspense, comédia ou os dois?

Um pequeno favor critica

São várias as vezes que nos deparamos com histórias de suspense saturadas de mistério e pontos de virada chocantes. Assim como também não são poucas as comédias familiares com personagens brincalhões em situações desconfortáveis. Já imaginou amarrar uma trama contendo elementos narrativos (e técnicos) desses dois tipos de filme? Pelo jeito, Paul Feig já.

Em Um Pequeno Favor o diretor aborda uma história contada através do olhar e experiência de Stephanie (Anna Kendrick), uma mãe viúva que se dedica aos cuidados de seu filho, e também ao seu canal (vlog) de culinária. Após seu filho fazer amizade com outro garoto na porta da escola, Stephanie passa a criar uma relação com a mãe deste menino, Emily (Blake Lively), uma mulher rica e vaidosa. A relação entre as duas logo se transforma em amizade, mas o problema aparece quando Emily, aparentemente sem nenhuma razão, some sem deixar vestígios. Preocupada com a amiga, a protagonista dá início à uma movimentada busca por respostas para saber o que de fato aconteceu.

Num artifício inteligente de roteiro, já de cara notamos a presença de duas mulheres que se complementam não apenas nas personalidades entre si, mas também em relação aos gêneros cinematográficos nos quais suas figuras vão orbitar.

Stephanie, embora uma mãe atenciosa e responsável, se mostra uma mulher insegura, cheia de desejos não realizados, enquanto Emily, é uma mulher confiante e ousada, mas que mal sabe cuidar de seu filho. A atuação de Blake Lively, fundada em cima de olhares suspeitos, puxa a história para o suspense dramático, enquanto Anna Kendrick fica responsável pelos suspiros de comédia, com seu jeito desengonçado e forte senso de humor.

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A roteirista Jessica Scharzer, juntamente com Darcey Bell, a autora do livro que inspirou o filme, brinca com sua própria história e seus clichês, deixando-a divertida e acessível a todos os públicos, até mesmo aqueles que não gostam de suspense (se é que existem), e não decepciona quem já bebe das origens do gênero, utilizando de uma trama investigativa e envolvente, que não abdica de reviravoltas imprevisíveis para dar ainda mais vida à história.

Com a presença ainda de Henry Golding como Sean, o marido de Emily (e terceiro personagem mais importante do filme, mas evidentemente ofuscado pelo show da dupla de atrizes principais), constrói-se um trio de indivíduos imperfeitos, cada um com um (ou mais) defeito(s), desde a infidelidade e a inveja, até a presunção e a insensibilidade.

Essas questões aproximam os personagens do público, e se equilibram com a maneira como a narrativa é estruturada, que faz o contrário. Intencionalmente, o enredo traz situações improváveis que se resolvem de forma inusitada e fora do comum. Por não ser um suspense que “se leva a sério”, aqui isso não incomoda e apenas complementa o tom cômico desses eventos.

Curioso que mesmo com um grande material em mãos, a presença de duas mulheres com características diferentes e com passados traumáticos, tentando criar um filho e fazendo o possível para serem felizes em suas vidas amorosas, o filme não se propõe a estabelecer observações sobre como essas questões se refletem no nosso cotidiano. Paul Feig (de Missão: Madrinha de Casamento e do recente remake de Caça-Fantasmas) abre mão do drama particular de cada uma dessas personagens para dar atenção ao desenvolvimento do ritmo da trama principal, e ainda assim o filme consegue ser divertido e surpreendente.

Um Pequeno Favor não é uma revolução no gênero de suspense com comédia (como sugere seu exagerado marketing), mas é uma bela execução e um ensinamento de como trazer ansiedade e cenas engraçadas ao mesmo tempo, juntamente com belos figurinos, músicas envolventes (principalmente as francesas) e uma montagem admirável. A oportunidade de ver Anna Kendrick e Blake Lively contracenando tão bem juntas torna a experiência ainda mais prazerosa. Despretensão e bom humor são as únicas exigências da história para com seus espectadores, que podem sair da sala de cinema mais satisfeitos do que imaginam.

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João Pedro Accinelli

Amante do cinema desde a infância, encontrou sua paixão pelo horror durante a adolescência e até hoje se considera um aventureiro dos subgêneros. Formado em Cinema e Audiovisual, é idealizador do CurtaBR e co-fundador da 2Copos Produções. Redator do Cinematecando desde 2016, e do RdM desde 2019.