Crítica: Happy End
Este filme faz parte da programação oficial da 41ªMostra Internacional de Cinema em São Paulo.
Já na sequência de créditos iniciais de Happy End, o diretor Michael Haneke nos surpreende com uma série de curtos vídeos gravados em um celular. Em seguida, quando o filme de fato começa, imagens captadas por uma câmera de segurança, detalhando um acidente em um terreiro de obras. Claro, o longa eventualmente toma contornos mais tradicionais, mas é bom ver como Haneke pontua sua narrativa de maneira tão intrigante no uso da tecnologia, sempre com um rigor imagético que, mesmo aparentando frio, vem carregado de verdades sobre seus angustiados personagens. O cineasta austríaco, em seus 75 anos, apresenta uma audácia que muitos jovens diretores desejariam ter.
Estaria mentindo se dissesse que sou versado no cinema de Haneke: assisti apenas ao excelente Amor, o perturbador Violência Gratuita e boa parte de Caché. Ainda que não tivesse visto nenhum, o estilo do diretor salta facilmente aos olhos e ouvidos, através dos enquadramentos minuciosos e a falta de uma trilha sonora, sempre convidando o espectador a dedicar sua atenção e paciência à narrativa, sem nunca esperar respostas fáceis (ou respostas por si só). Em comparação às obras anteriores que vi, Happy End é facilmente a mais tragável e menos violenta ao psicológico, mas ainda é claramente algo provindo da mente pessimista (ou seria realista?) de Haneke.
Não há nenhuma boa razão para entregar a história de Happy End neste texto. Assim como os últimos longas do iraniano Abbas Kiarostami, grande parte da magia surge da oportunidade de montar a narrativa durante a experiência, mantendo-se atento aos detalhes. A melhor parte disso é o sentimento voyeurístico de invadir o mundo privado de seus personagens, que é enaltecido pelas perspectivas que Haneke adota para contar suas histórias. Quando, por fim, os fios narrativos antes soltos são conectados, o sentimento de satisfação é inevitável.
Posso sim, então, expressar minha admiração pelo elenco, que mescla veteranos e novatos de maneira orgânica. É assustador constatar que, em um longa que conta com Isabelle Huppert (Elle) e Mathieu Kassovitz (Amélie), o grande destaque fique para a jovem Fantine Harduin, que com apenas 13 anos de idade entrega uma interpretação de maturidade inestimável, inclusive se segurando em frente ao experiente Jean-Louis Trintignant em um dos melhores diálogos do filme. Inclusive, o forte paralelo entre os arcos de Harduin e Trintignant exalta o belo ciclo de infelicidade que, caso Haneke contasse com intérpretes menos preparados, não marcaria tanto.
Com uma conclusão afiadíssima, Happy End pode não ter o mesmo impacto geral que alguns dos longas anteriores de Haneke, mas deixa claro o poder da singular voz que o cineasta apresenta ao cinema mundial, como se estivéssemos sozinhos frente a frente, trocando pensamentos e ideias que, mesmo duros, são essencialmente honestos.
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