Crítica: Animais Noturnos
O estilista Tom Ford estreou na direção de cinema com o elogiado filme Direito de Amar (A Single Man) em 2009. E agora, sete anos depois, Ford retorna ao cinema com outro projeto baseado em um livro; só que, diferente de Direito de Amar, que é uma obra extremamente sensorial e melancólica (e que também conta com uma grande atuação de Colin Firth), Animais Noturnos (Nocturnal Animals) mistura suspense, drama e também alguns temas fortes como vingança e perdas. Tudo isso junto a um tom sombrio, que prende desde seus créditos iniciais.
Por ser uma figura importante da moda, o diretor não hesita em inserir o que entende da área em seus filmes. Animais Noturnos é um deleite para aqueles que amam prestar atenção em aspectos como fotografia e figurino. A produção é inquestionavelmente impecável, e até mesmo a abertura – que poderia muito bem ser apenas uma forma de mostrar tal entendimento da área visual – tem contexto dentro da história que quer contar. Essa é uma das maiores forças do filme, pois Ford soube unir bem a estética com a narrativa. Elementos que, unidos, consistem em formar um dos melhores filmes de 2016.
O mais interessante do filme é que ele não conta apenas uma história; na verdade, acompanhamos três histórias, sendo todas elas ligadas à personagem Susan Morrow (Amy Adams), uma negociante de arte de Los Angeles. Apesar de viver uma vida privilegiada, ela se sente infeliz e incompleta ao lado de seu marido Hutton Morrow (Armie Hammer) e não possui muita perspectiva em sua vida pessoal e profissional. Até que um certo dia, Susan é surpreendida quando recebe um pacote inesperado: um livro escrito por seu ex-marido, Edward Sheffield (Jake Gyllenhaal), e dedicado especialmente a ela. No decorrer da leitura do livro, é estabelecida a ligação entre as três histórias: a de Susan no presente, a de Susan no passado, e a que é contada no livro de Edward. A alternância entre essas narrativas é bem construída e torna o filme extremamente imersivo, sendo impossível não ficar no mínimo curioso para saber o que vai acontecer. Ponto positivo para a montagem inteligente e bem pontuada de Joan Sobel, que entrelaça várias semelhanças visuais (inclusive entre atores, aproveitando, por exemplo, a semelhança entre Amy Adams e Isla Fisher).
A história do manuscrito feito por Edward é tão envolvente quanto a história “principal”, pois é nela que reside todo o tom sombrio que citei no início do texto. Nesta camada do filme, vemos a história de uma família que está viajando tranquilamente, mas que acaba cruzando o caminho de criminosos. Tanto Edward quanto o pai de família do livro são interpretados por Jake Gyllenhaal, o que resulta em algumas teorias sobre a ligação entre os dois. Aliás, também é nesta camada de Animais Noturnos que estão as performances mais fortes e sensacionais do filme: Gyllenhaal entrega uma atuação digna de Oscar, enquanto Michael Shannon, mais uma vez, impressiona com sua força no olhar e em sua articulação, provando ser um dos melhores atores da atualidade. A surpresa fica por conta de Aaron Taylor-Johnson (mais conhecido por ser o Kick-Ass no cinema), que interpreta um dos criminosos e surpreende não só por ser o vilão, mas por executar o papel de maneira fantástica, com muita presença.
O elenco está muito bem distribuído e inclusive conta com participações notáveis de Isla Fisher e Laura Linney (que participa de um dos melhores diálogos do filme com a personagem Susan). E, claro, Amy Adams dá mais um show de interpretação com sua misteriosa personagem, que aos poucos vai se abrindo para o espectador descobrir o que há debaixo daquela personalidade fria e distante. Por que ela é tão infeliz? O que a deixou tão assustada e preocupada com seu passado ao ler o livro de Edward? Essas são questões que são bem exploradas no filme e que, acredite, te farão pensar muito após a sessão.
Animais Noturnos é um filme que não se encaixa na palavra “convencional” tanto por sua forma como pelo cenário cinematográfico mundial. Em uma chuva de blockbusters, é sempre bom assistir a um filme que te faz pensar e tentar completar esse quebra-cabeça que é apresentado em 2h de projeção com tantos simbolismos e mensagens. Por mais que deixe um pouco a desejar em alguns diálogos, ele merece toda sua atenção – e, principalmente, a reflexão, pois deixa um final aberto (e um tanto quanto desconfortável), com as inúmeras possibilidades que aparecerem em sua mente.
FICHA TÉCNICA
Direção: Tom Ford
Roteiro: Tom Ford
Elenco: Aaron Taylor-Johnson, Amy Adams, Armie Hammer, Isla Fisher, Jake Gyllenhaal, Karl Glusman, Laura Linney, Michael Shannon, Michael Sheen, Neil Jackson, Robert Aramayo, Zawe Ashton
Produção: Robert Salerno, Tom Ford
Fotografia: Seamus McGarvey
Montador: Joan Sobel
Trilha Sonora: Abel Korzeniowski
Duração: 115 min.
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