Crítica: Stranger Things (2ª temporada)
Manter o nível da temporada anterior é, pelo menos, o maior objetivo de qualquer série de TV, mas quando sua antecessora é a primeira temporada de Stranger Things, não demora para perceber que a tarefa seria extremamente árdua – ou até impossível. Felizmente, a segunda temporada dá ótimos presentes narrativos para seu público, por mais que não consiga manter o mesmo nível da primeira. Ela desenvolve ainda mais seus personagens ao buscar novos arcos, aproveita bem seus efeitos especiais e traça uma reflexão emocional entre o expectador e os personagens bem maior que na temporada passada.
Em sua volta, a popular série nos remete muito bem à sua identidade oitentista, não perdendo a mão na caracterização dos cenários (mesmo em época de Halloween). É delicioso se deparar com todos esses queridos personagens novamente, pois a saudade deixada pela primeira temporada (lançada há mais de um ano) foi grande, e qualquer fã da série ama a ansiedade de poder se relacionar com as piadas nostálgicas de Dustin, Lucas e Mike, se deliciar com os poderes de Eleven, torcer pelo relacionamento de Nancy e Jonathan, e finalmente conhecer um pouco mais sobre Will.
No primeiro episódio, notamos a relação preocupante e super-protetora de Joyce e Jonathan para com Will, que acabou de voltar do mundo invertido, mas que ainda possui alguns flashes de “memórias do agora” (como diz Mike), que nada mais são do que um vínculo que o personagem ainda possui com o lugar que passou praticamente toda primeira temporada. Visivelmente, todo o enfoque da segunda temporada está em Will. O personagem é finalmente aprofundado, suas relações com seus amigos, irmão, mãe e até seu suposto padrasto (Bob) são úteis para a trama. Mas o ponto alto do personagem é a magistral atuação de Noah Schnapp, que possui vários momentos para brilhar, seja em contextos dramáticos e fortes, ou em ápices de nervosismo e medo.
Stranger Things não deixa a desejar na caracterização de seus personagens, mas assim como busca dar enfoque para novos personagens, também não consegue cobrir algumas lacunas deixadas por outros já existentes. Joyce, Hopper e até Eleven possuem menos tempo em tela nesta segunda temporada, mas quando aparecem confirmam as características primitivas de suas personalidades. Personagens novos como Max (a nova e tímida integrante do grupo de Dustin, Mike, Lucas e Will), seu irmão Billy (um rabugento e estereotipado valentão da sala de Steve), Bob (o namorado de Joyce) e outros deixam a série mais interessante e abrangente, se apoiando cada vez mais em uma de suas maiores qualidades: a quantidade de personagens.
Se o roteiro acerta no aprofundamento dos personagens, ele dá uma pequena derrapada no desenrolar de seu enredo. Nada muito sério, mas o suficiente para não atingir o dinamismo e objetividade da primeira temporada. Vemos os primeiros episódios muito bem ambientados, e a construção de uma história clara, mas ao longo da série percebemos uma tentativa de abordar muitas histórias secundárias ao mesmo tempo, levando o expectador a perder um pouco o ritmo que construiu durante toda a primeira temporada. Mas por bem, a série consegue finalizar sua história principal muito bem, e faz com que os pequenos problemas de desenvolvimento fiquem para trás.
De qualquer forma, os roteiros dos episódios continuam sendo uma aula de como criar empatia com os personagens, preocupando-se com suas vidas, torcendo por suas ações e nos prendendo à narrativa – seja ela qual for. Quem também dá uma aula é a direção da série, compartilhada por nomes como Shawn Levy (também produtor-executivo), Andrew Stanton (de Procurando Dory), e Rebecca Thomas (que dirige o sétimo e mais destoante episódio). Mas é claro que o maior mérito da direção e roteiro vai para os irmãos Duffer (Matt Duffer e Ross Duffer), criadores da série que praticamente ditaram o ritmo para todos os outros. Pelo jeito eles aprenderam bem, utilizando de movimentos de câmera e enquadramentos simples, apenas procurando contar bem uma história.
Realmente brilhante é a direção de arte de Stranger Things, totalizando cenários, figurinos e o frequente uso do choque de cores vermelhas e amarelas (quentes) e azuis (frias), criando um ambiente ambíguo em todas as cenas, enfatizando o contraste entre o mundo real e o mundo invertido. Além de belo, é tudo idealizado em cima da amada década de 80, assim como a primeira temporada, o que trás à tona o carinho especial que todos expectadores já tinham com a série.
Junto com a direção de arte, o que agarra o expectador e o joga para dentro do universo dos anos 80 é a trilha sonora. Mais uma vez, as deliciosas músicas que fizeram a primeira temporada tão querida, continuam presentes. Não as mesmas (com exceção de Should I Stay Or Should I Go), mas sim a mesma identidade musical dos anos 80, com a junção do pop com o rock, e muitas bandas alternativas que amamos. Só que não são apenas as músicas dos anos 80 que se saem bem. A própria trilha musical originalmente composta por Kyle Dixon multiplica a imersão do expectador, fazendo do uso de sintetizadores e a oposição entre harmonias tensas e suaves, ajuda o público a entrar na história, servindo também de apoio emocional em cenas dramáticas.
E um salve para os efeitos especiais! Visualmente incríveis, narrativamente necessários, e bem aplicados. Eles comprovam a qualidade de Stranger Things em ser uma série que embaralha satisfatoriamente elementos do drama, suspense, terror e ficção científica.
Em minha opinião, esta é a maior série original Netflix. Com duas temporadas, deixou as conhecidas House of Cards e Orange Is The New Black para trás e fez um sucesso monstruoso (em todos os sentidos) entre os amantes de uma boa história com ótimos personagens, bons atores, e de aspectos técnicos infalíveis.
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