Crítica: The End Of The F***ing World (1ª Temporada)

Crítica: The End Of The F***ing World (1ª Temporada)

Nostalgia. Em minha interpretação, esse é um sentimento não tão almejado por seriados de televisão. Mais especificamente, digo que hoje em dia é muito mais comum a presença de filmes que tratem da adolescência como um período nostálgico do que séries, ainda que de vez em quando apareça uma Stranger Things para satisfazer nossa necessidade de maratonas. A nova série britânica The End Of The F***ing World, que teve seus direitos comprados pela Netflix, é uma dessas obras que chegam para entreter qualquer um, mas principalmente criar uma identificação com aqueles que tenham passado pela fase rebelde e deslocada da adolescência.

Caracterizando-se como uma dark comedy (comédia que aborda questões sérias ou pesadas), a série tem sim suas pontadas de nostalgia ao apresentar a insatisfação dos personagens principais com suas vidas e a ânsia pela liberdade que qualquer adolescente possui. Ainda assim, não é a nostalgia seu maior foco ou objetivo, mas sim uma história paralela bem interessante que acompanha os personagens ao longo dos episódios, e que promove, de uma forma ou de outra, a simpatia do espectador pelos personagens principais.

James (Alex Lawther) ainda não sabe, mas está prestes a mudar de vida com a chegada de uma garota nova no seu colégio. Assim como ele, a novata Alyssa (Jessica Barden) também tem problemas em se relacionar com outras pessoas e se vira muito melhor sozinha. Aos olhos alheios, são apenas dois adolescentes estranhos; para eles, trata-se da parceria perfeita. James acredita que possui tendências psicopatas, enquanto Alyssa é revoltada com tudo e com todos, tendo dificuldades para se adaptar a qualquer coisa.

Já no primeiro episódio notamos uma presença de cena muito grande dos atores Lawther e Barden, que possuem uma química natural e ao mesmo tempo diferente. A estratégia de diálogos secos, irônicos e objetivos se torna algo muito parecido com a forma de interação entre Oliver e Jordana em Submarine (2010), apoiando-se em uma relação amorosa anti-romântica que consegue ser cômica e ao mesmo tempo graciosa. Não apenas juntos os atores se saem bem, mas também isoladamente, quando se mostram extremamente inseridos nas personalidades complexas de seus personagens.

The End Of The F***ing World tem uma direção de arte que, embora não seja tão marcante, se encaixa facilmente entre uma das mais criativas das séries distribuidas originalmente pela Netflix. Por vezes, reparamos a fidelidade do estado de espírito ou mesmo da personalidade refletida no figurino dos personagens. No primeiro episódio por exemplo, acompanhamos Alyssa com seu moletom vermelho que denota revolução, rebeldia, uma peça fora de lugar. Assim como James, por sua vez, utiliza uma camisa preta (ou azul bem escuro), que pode querer manifestar sua figura obscura ou até perigosa (primeira foto).

O principal assunto da série que vai ditar os eventos dos episódios seguintes é propriamente um spoiler. Spoiler este claramente evitado pelo próprio trailer, que apesar de aparentemente mostrar demais, na verdade não mostra nada, pois com o trailer não temos nem noção das aventuras que James e Alyssa ainda irão se meter. Aliás, essa é uma das maiores qualidades do roteiro: a tamanha imprevisibilidade dos acontecimentos.

A sábia fotografia da série procura evidenciar a “fofura” e a inocência dos personagens (ainda que possam parecer perigosos continuam sendo apenas adolescentes deslocados aos olhos do espectador) com movimentos lentos de aproximação em planos próximos/médios que ajudam no caráter visual da obra, estabelecendo um dinamismo impressionante. O que também deixa tudo mais dinâmico e divertido é a montagem, muito bem executada com o propósito de incluir os pensamentos dos personagens em sentido cômico ou deprimente. Os cortes rápidos deixam os planos curtos e dão velocidade no desenvolvimento da história, que nem precisaria ser veloz uma vez que cada episódio dura em média apenas 20 minutos.

Falando em diversão, destaque para um dos melhores aspectos da série: a inteligente e arrojada trilha musical. É muito bacana quando se busca pensar fora da caixinha e trazer coisas diferentes para o cinema e para a televisão. Um bom exemplo disso é a combinação de músicas antigas e românticas da série que se encontram em uma completa falta de sincronia com a proposta das cenas em que são inseridas. Calma, você não leu errado. Porém isso não é um erro. Pode parecer estranho, e é! Mas é essa estranheza que alcança o propósito: o humor, a comicidade. Só assistindo para entender e absorver essa intrigante intenção.

A primeira temporada de The End Of The F***ing World é uma das temporadas mais curtas, divertidas e sedutoras que você vai encontrar por aí. A série já possui uma crescente legião de fãs que mal pode esperar por uma segunda temporada, principalmente depois de um possível e angustiante gancho deixado no último episódio dessa temporada. Visto que a série abrange um amplo público alvo, recomendo para os apaixonados e para os não apaixonados. Para os certinhos e para os rebeldes. Por fim, indico para qualquer amante de uma boa história cheia de aventuras e imprevistos.

João Pedro Accinelli

Amante do cinema desde a infância, encontrou sua paixão pelo horror durante a adolescência e até hoje se considera um aventureiro dos subgêneros. Formado em Cinema e Audiovisual, é idealizador do CurtaBR e co-fundador da 2Copos Produções. Redator do Cinematecando desde 2016, e do RdM desde 2019.