Crítica: La La Land

Crítica: La La Land

Obras cinematográficas com uma temática clássica que comove e inspira sua plateia estão escassas hoje em dia, principalmente por conta do visível e gradual desinteresse do público para com épocas antigas e seus costumes. Porém, Damien Chazelle provou mais uma vez que não é apenas Woody Allen que sabe tocar o público com trilhas fantásticas de jazz e roteiros originais. Acha que é só? La La Land vai além disso, sabendo ser perfeito em todos os sentidos, deixando o crítico cinematográfico em um beco sem saída por não conseguir encontrar defeitos neste filme espetacular. Se você, leitor, não consegue se encontrar em musicais, este é o momento perfeito para expandir seus gostos e se deliciar com uma obra idealizada, mas ao mesmo tempo realista.


O que mais nos deslumbra já no início do filme é a paleta colorida da fotografia luxuosa e imponente de Linus Sandgren (que já trabalhou com David O. Russell em produções como Trapaça e Joy) e os incomuns movimentos de câmera, além dos planos longos, de poucos cortes (o que facilita, mas não anula o trabalho da fabulosa montagem de Tom Cross), muito bem esquematizados pelo incrível diretor, explorando os ambientes e criando uma gostosa sensação de intimidade com o espectador. Passamos a desejar cada vez mais cenas deliciosas com a talentosa dupla de atores formada por Emma Stone e Ryan Gosling, que, embora tenham entregado boas interpretações em Amor a Toda Prova e Caça aos Gângsteres, provam em La La Land o melhor de sua química, que não à toa lhes renderam Globos de Ouro como Melhor Ator/Atriz em Comédia ou Musical.

O enredo toma forma quando um pianista de jazz chamado Sebastian (Ryan Gosling) conhece a iniciante atriz Mia (Emma Stone) em Los Angeles, e os dois se apaixonam perdidamente. Em busca de oportunidades para suas carreiras na competitiva cidade, os jovens tentam fazer o relacionamento amoroso dar certo enquanto perseguem fama e sucesso. O filme aborda o gênero jazzístico (e sua decadência) como poucos, aliando-o à fidelidade de seu figurino, que por dentro de várias referências a memoráveis clássicos da Era de Ouro Hollywoodiana, constroem um clima nostálgico e exultante.

Como um crítico, em sã consciência, poderia deixar de mencionar a importância da trilha sonora nesta obra? O vencedor do Globo de Ouro Justin Hurwitz leva ao público uma boa combinação de jazz e pop, que se torna incansável aos ouvidos da plateia – principalmente a premiada canção City of Stars. Os números musicais são envolventes e dançantes, contagiando até os espectadores mais “chatos”. A maior vantagem do filme é que, diferentemente de Os Miseráveis (último musical altamente repercutido pela crítica), La La Land alcança um interesse natural do público e torna-se acessível a qualquer um, principalmente por não ser um filme longo e 100% cantado (o que pode cansar muitas pessoas), e também por não conter uma carga dramática tão forte. Mas, ainda assim, a obra demonstra uma boa pluralidade em seu gênero, sabendo nos fazer rir com algumas piadas e cenas cômicas, nos emocionar com cenas tristes, e nos inspirar em momentos românticos (se não mágicos), que recheiam e enriquecem nossa experiência diante da telona.

Além do próprio jazz em si, Chazelle nos traz alguns elementos que nos remete à sua última obra, Whiplash. Entre eles estão: pessoas buscando seus sonhos e tentando conciliá-los com seus interesses amorosos, e o sempre perspicaz J.K. Simmons, que mesmo não possuindo um significado relevante para o filme, aparece logo no início como Bill, o patrão de Sebastian, que o ordena de maneira insensível (é possível fazer uma assimilação com o icônico personagem Terence Fletcher) a tocar apenas músicas natalinas populares, o que chateia Sebastian, que tradicionalista como é, vê no improviso e no jazz sua maior paixão. Quem também marca presença como coadjuvante é o famoso cantor John Legend, interpretando Keith, um antigo amigo de Sebastian que, diferente deste, vê no jazz uma forma distinta de se manifestar.

Além de dirigir o filme impecavelmente, Damien Chazelle faz seu nome por desenvolver um roteiro único, que trabalha bem seus possíveis clichês sem torná-los massivos. E usando dessa moderada previsibilidade, acrescenta diálogos persuasivos, que, embora tenham sido muitas vezes improvisados por Gosling e Stone, não perde seu valor em transmitir perfeitamente os sentimentos e opiniões dos personagens, que inclusive se arquitetam expressivamente bem em cima de seus próprios receios e ambições. Por fim, não resta dúvidas de que Chazelle mereceu ser premiado duas vezes na última edição do Globo de Ouro (08/01) como Melhor Roteirista e como Melhor Diretor.

Sinceramente, o cinema estava precisando há tempos de um filme tão considerável como La La Land. É clara a importância de histórias originais e bem contadas para a evolução cinematográfica, mas não podemos nos esquecer dos grandes clássicos que sempre ficarão guardados em nossa memória; e uma ótima forma de homenageá-los é através de referências audiovisuais marcantes, por mais que a obra não possua em seu enredo grandes pretensões reflexivas, sendo seu maior foco comemorar, sensibilizar, e tornar inesquecível a experiência do público. Odiar, gostar ou amar esta obra-prima sempre será relativo, mas é necessário reconhecer sua importância em uma época repleta de conflitos políticos e diferenças culturais, sendo o objetivo do filme (assim como o jazz) unir todos os seres humanos por meio de seus corações frágeis e sensíveis, e deixar o espectador vulnerável com seus elementos visuais e sua belíssima narrativa.

La La Land se faz um filme necessário. Necessário por lembrar e criar ótimas referencias à clássicos do cinema como Juventude Transviada, Casablanca e Cantando na Chuva, obras tão relevantes para a Sétima Arte. Necessário por reviver os musicais através do jazz, gênero cada vez mais esquecido pela mídia musical. Necessário por ressaltar que histórias de amor não devem ser descartadas tão cedo, pois claramente ainda divertem e possuem o poder de deixar o espectador com lágrimas nos olhos. Com certeza, essa é uma obra que merece vencer o Oscar em várias categorias, incluindo a de Melhor Filme. E, assim como a personagem de Emma Stone diz/canta, La La Land é para aqueles que sonham, para os tolos como podem parecer, e para os corações que se permitem ser partidos.

FICHA TÉCNICA
Direção e Roteiro: Damien Chazelle
Elenco: Emma Stone, Ryan Gosling, John Legend, J.K. Simmons, Rosemarie DeWitt, Jessica Rothe, Sonoya Mizuno, Callie Hernandez, Finn Wittrock
Produção: Fred Berger, Gary Gilbert, Jordan Horowitz, Marc Platt
Fotografia: Linus Sandgren
Trilha Sonora: Justin Hurwitz
Montagem: Tom Cross
Gênero: Musical / Romance
Duração: 128 min.

João Pedro Accinelli

Amante do cinema desde a infância, encontrou sua paixão pelo horror durante a adolescência e até hoje se considera um aventureiro dos subgêneros. Formado em Cinema e Audiovisual, é idealizador do CurtaBR e co-fundador da 2Copos Produções. Redator do Cinematecando desde 2016, e do RdM desde 2019.