Crítica: O Outro Lado da Esperança
Este filme faz parte da programação oficial da 41ªMostra Internacional de Cinema em São Paulo.
O Outro Lado da Esperança, do finlandês Aki Kaurismäki, é praticamente um antimelodrama. A história ressoa com os tempos atuais, acompanhando um refugiado sírio que procura asilo da Finlândia, cujo caminho cruza com o de um vendedor que acabou de comprar um restaurante. Com uma estética reminiscente dos anos 60, a la Technicolor, o humor seco do longa e sua ausência de fatalismo tornam O Outro Lado da Esperança em uma experiência deliciosa de se ter no cinema.
O refugiado Khaled (Sherwan Haji) é um protagonista quieto, sereno, apesar da dor de ter um país natal em frangalhos. Wikström (Sakari Kuosmanen), o vendedor, é igualmente silencioso, revelando aos poucos uma alma bem-intencionada. Os dois demoram a se encontrar, talvez até pouco menos de 1 hora dentro do longa. Por isso mesmo é de se admirar o quanto Kaurismäki se dedicou a construir o universo pessoal de cada um deles, com poucas palavras e muitos detalhes. Assim, o encontro dos dois torna-se ainda mais satisfatório.
Mas O Outro Lado da Esperança é também fortalecido por um elenco de apoio excepcional. Janne Hyytiäinen, Ilkka Koivula e Nuppu Koivu estão perfeitos como os funcionários do restaurante, que parecem saídos de um quadro de Edward Hopper. Simon Hussein Al-Bazoon também está ótimo como Mazdak, o refugiado iraquiano que forma uma amizade com Khaled, enquanto Niroz Haji também não faz feio como Miriam, a irmã do sírio.
Este é o primeiro filme de Kaurismäki que vejo, e já estou apaixonado pelo minimalismo de sua direção. Não há exageros no drama e nem na comédia, que é um dos pontos fortes de O Outro Lado da Esperança. A música não se intromete, tocando apenas quando há uma banda em cena. Os diálogos são econômicos, dizendo apenas o necessário, o que preserva a força de cada ótima constatação: em um momento, Khaled diz a seu amigo Mazdak que se apaixonou pela Finlândia, mas o pede para sair de lá o quanto antes, provavelmente devido às burocracias da política de imigração e os grupos supremacistas que disseminam seu ódio nas ruas. O trecho poderia contar com a mão pesada de outro diretor, mas a secura cômica de Kaurismäki o deixa honesto, se não mordaz.
Com a fotografia retrô de Timo Salminen e a direção de arte de Markku Pätilä flertando com o kitsch, O Outro Lado da Esperança é certamente um olhar único e gracioso sobre algumas das questões mais inquietantes desses tempos. Pelo título, imagina-se algo como o cinema reluzente de Frank Capra. O filme de Kaurismäki pode até parecer feito há umas 5 décadas ou mais, mas seus pés estão firmemente fincados no hoje.
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