42ª Mostra – Crítica: A Madeline de Madeline
Turbilhão de sensações
Ao longo de A Madeline de Madeline, a protagonista (Helena Howard) desempenha vários papéis: é uma gata, uma tartaruga marinha, filha, pupila, aluna de um grupo de teatro… No meio disso tudo, como qualquer adolescente, ela procura encontrar a própria identidade. É esta a jornada proposta no vibrante longa dirigido por Josephine Decker, que tira o máximo da linguagem cinematográfica para apresentar sua história.
Um desenho de som cuidadoso alterna em alguns momentos trilha percussiva, sussurros e ruídos dos mais variados. A câmera se movimenta constantemente, dando à fotografia uma fluidez essencial para que seja possível ver o mundo pelos olhos de Madeline e sua mente fervilhante.
A garota aspirante à atriz convive com distúrbios mentais e uma relação tumultuada com a mãe (Miranda July, escritora e diretora de filmes como O Futuro e Eu, Você e Todos Nós). Ela encontra algum acolhimento na atenção que ganha da professora da companhia onde ensaia, Evangeline (Molly Parker, de House of Cards). Porém, passa a questionar os interesses da mentora conforme esta se apropria de passagens da vida da jovem para servir de base ao espetáculo, uma atitude no limite do exploratório.
É um questionamento também acerca do efeito catártico da arte, e a responsabilidade de alguém que puxa as experiências traumáticas de um aluno para usá-las, sem se preocupar tanto com o estrago que isso pode causar no emocional desta “cobaia”.
Além de discutir esta relação de poder, num espectro diferente dos tipos de abuso psicológico frequentemente retratados no cinema, o filme toca ainda na questão racial. Madeline é uma menina negra, enquanto Evangeline faz parte da suposta elite intelectual branca, mesmo que seja casada com um homem negro. Sendo assim, é ainda mais complicada a questão de apropriação, como mostra o desconforto que impera numa das cenas perto do final.
A Madeline de Madeline é um longa sensorial, expressionista. Sua narrativa se utiliza de muitas elipses, com as ações muitas vezes pulando de espaço e tempo sem a necessidade de muitas explicações. É uma obra ousada e original, que apresenta duas forças que valem ser acompanhadas com atenção em seus próximos projetos, Helena e Josephine. A jovem atriz de 20 anos tem uma performance intensa, que impressiona ainda mais por ser sua estreia no cinema. Já a cineasta, em seu terceiro longa-metragem, prova-se uma voz instigante entre os autores e autoras norte-americanos da atualidade.
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