42ª Mostra – Crítica: La Quietud
Melodrama rodriguiano com grife portenha
Há algo de Nelson Rodrigues em La Quietud, novo filme do diretor argentino Pablo Trapero. Uma tensão erótica latente, um drama familiar que investiga as hipocrisias cotidianas daqueles personagens, adultério, sugestões de incesto. Muito daquilo que o dramaturgo e cronista conhecido como “Anjo Pornográfico” tratava em suas obras.
Conhecido por tratar de questões políticas e sociais em seus últimos trabalhos (Abutres, Elefante Branco e O Clã), o cineasta se arrisca agora no território do melodrama. A trama parte do reencontro entre as irmãs Mia (Martina Gusman) e Eugenia (Bérénice Bejo, de O Artista), que voltam a se ver após o pai ser colocado em coma por conta de um AVC. A primeira é bastante apegada ao velho homem, um respeitado advogado, enquanto a segunda vive em Paris.
Enquanto esperam a resolução do quadro clínico do pai, as duas se refugiam na luxuosa fazenda familiar, cujo nome dá título ao filme, ao lado da mãe, Esmeralda (Graciela Borges), que não faz questão de esconder sua predileção a uma delas, Eugenia, a primogênita, que conta estar grávida. A notícia causa incômodo em Mia, por motivos que apenas mais adiante ficarão claros.
Esta é uma família que prefere evitar assuntos desconfortáveis, mesmo se a questão for apenas a constante falha nas luzes da residência, um problema ao mesmo tempo visível e ignorado pelos personagens, numa situação que ajuda a dar um efeito cômico àquele contexto carregado de mágoas.
Trapero, também autor do roteiro, já demonstrou ser um cineasta virtuoso, capaz de criar imagens potentes. Em La Quietud ele filma o encontro entre Eugenia e Mia em algo extremamente fetichista, como na cena em que ambas se masturbam na mesma cama. O plano-sequência longo e impecável, uma das marcas registradas do diretor, também dá as caras, durante um velório em que todas as emoções dos personagens entram em ebulição.
A crítica política, sugerida no momento em que Eugenia e sua mãe discutem sobre chamar ou não de Ditadura a época em que a Argentina foi comandada por militares, ganha mais força no final, quando antigos esqueletos são tirados do armário. É quando já não há mais dúvidas: este é, de fato, um filme feito por Pablo Trapero. E dos bons.
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