Crítica: Agnus Dei

Crítica: Agnus Dei

Na Polônia, perto do fim da Segunda Guerra Mundial, mais de 30 freiras vivem afastadas em um convento. A alguns quilômetros dali, a Cruz Vermelha se encarrega de cuidar dos franceses que sobreviveram à guerra antes deles serem repatriados. Tirando o forte frio de inverno, tudo vai aparentemente bem; até que uma das freiras aparece no centro médico implorando por ajuda. A jovem médica francesa Mathilde reluta em ajudar no início, mas quando aceita o pedido, encontra um problema muito maior do que jamais poderia imaginar.

Com a invasão dos russos na Polônia desde 1944, o convento não conseguiu se proteger e foi invadido pelos soviéticos, que, com a permissão de seus superiores usando a desculpa de que eles mereciam uma “recompensa”, acabaram violentando diversas freiras inúmeras vezes. Um tema tão forte como o estupro já é horrível por si só, mas quando se trata de freiras e de uma história pouco conhecida, porém real, fica ainda mais difícil tentar compreender tais acontecimentos. Nada muito diferente do que acontece hoje em dia, especialmente no Brasil.

A talentosa diretora e roteirista Anne Fontaine, que se tocou profundamente com essa história sobre maternidade e questionamento da fé, entregou emAgnus Dei um filme forte, denso e que provoca inúmeras reflexões. O roteiro não tem como foco discutir a Guerra em si; o que ele trata com atenção são as consequências dos atos brutais dentro do convento e de como as freiras grávidas lidam com essa provação, dando uma sensação inevitável de enclausuramento.

A protagonista Mathilde é muito interessante e se contrasta dentre as mulheres com quem acaba criando um belo laço. Ela não acredita em Deus, é independente e abandonou seu lar na França para trabalhar na Polônia. De início, tanto Mathilde quanto as irmãs não se sentem à vontade ao lidar com os partos, afinal, a moça estrangeira só deveria ajudar os franceses e as irmãs têm medo de alguém descobrir o que houve no convento (elas poderiam ser expulsas da Igreja Católica mesmo sendo vítimas dos atos). A protagonista não é aceita pela irmandade de início, mas como o número de mulheres grávidas acaba sendo surpreendente, sua ajuda torna-se extremamente necessária.

Entre idas e vindas às escondidas ao convento, Mathilde acaba conhecendo as irmãs por baixo de seus hábitos e enxerga mulheres que, mesmo tendo a fé em primeiro plano, possuem dúvidas e medos em suas mentes, assim como qualquer outro ser humano – ainda mais por elas estarem vivendo dias sombrios e cheios de provações.

Em Agnus Dei, o espectador passa pelo inverno sem cor até chegar na primavera de sol, e essa mudança aparente das estações nas cenas se encaixa perfeitamente no cenário da história que o filme conta. A fotografia é um dos aspectos mais bonitos da obra, e essa relação com a história chama muita atenção.

É preciso dizer que este não é um filme fácil de se assistir, mas ao longo de seus 100 minutos Agnus Dei consegue ir além das tragédias que são apresentadas para deixar o espectador com o coração um tanto quanto mais leve no fim da sessão, mesmo que ainda inconformado com as atrocidades que o ser humano é capaz de fazer.

FICHA TÉCNICA
Direção: Anne Fontaine
Roteiro: Alice Vial, Anne Fontaine, Pascal Bonitzer, Sabrina B. Karine
Elenco: Agata Buzek, Agata Kulesza, Anna Próchniak, Dorota Kuduk, Eliza Rycembel, Helena Sujecka, Joanna Fertacz, Joanna Kulig, Katarzyna Dabrowska, Klara Bielawka, Leon Latan-Paszek, Lou de Laâge, Mariusz Jakus, Mira Maluszinska, Pascal Elso, Thomas Coumans, Tomasz Sobczak, Vincent Macaigne, Zacharjasz Muszynski
Produção: Eric Altmayer, Nicolas Altmayer
Fotografia: Caroline Champetier

Barbara Demerov

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