Crítica: O Trabalho

Crítica: O Trabalho

Este filme faz parte da programação oficial da 41ªMostra Internacional de Cinema em São Paulo.

Em um dos momentos mais memoráveis de O Trabalho, documentário de Jairus McLeary e Gethin Aldous que está entre os indicados ao Gotham Award (possível garantia de que estará entre os finalistas no Oscar), dois prisioneiros, em meio a uma intensa sessão de terapia em grupo, se abraçam, esmagando seus microfones contra os peitos, ao ponto de escutarmos seus batimentos cardíacos. Grande parte da força que a experiência carrega vem justamente com os aspectos imprevisíveis que o cinema verité traz, exaltando toda e qualquer emoção.

Acompanhamos três homens, civis, que atendem a quatro sessões de terapia grupal para os encarcerados na prisão estadual de Folsom. Lá, os homens de fora estão no mesmo chão que os presos, trocando experiências de vida e investigando suas maiores angústias. Parece elusivo, mas a partir do primeiro segundo, é possível se identificar com os relatos. São homens com trajetos diferentes, mas que dividem diferentes dores e arrependimentos: a principal delas sendo uma figura paterna violenta ou mesmo ausente.

Nem todos os presos tem o mesmo espaço em tela, mas são inesquecíveis em suas personalidades. Dark Cloud é um ex-membro de uma gangue nativo-americana que é bastante terno com os visitantes, apesar de ainda lutar com sua vontade de machucar; Vega era um manda-chuva dos Crips, que, agora de semblante tranquilo, aconselha seus companheiros com paixão; há até mesmo um ex-supremacista ariano que encontrou, ironicamente, uma família entre minorias.

O que mais impressiona, mesmo, é a transformação sofrida em tela por cada um dos três visitantes ao longo dos quatro dias. Charles encara seu medo do ambiente da prisão, após viver com a dor de ter um pai encarcerado ainda quando criança. Brian, por sua vez, evidencia uma atitude esquentada, que acaba gerando tensão com alguns dos prisioneiros. Chris, por fim, é o mais tímido e cético dos três, para no final se abrir ao processo de maneira tocante.

Os dois últimos são o centro de momentos tão intensos quanto reveladores. Brian, desafiado por um dos prisioneiros após uma observação fora de lugar, tem uma explosão de raiva, alegando ter o desejo de matar quando se sente desrespeitado. Chris, que antes acreditava não ser capaz de simpatizar com o processo, finalmente aborda suas frustrações com o pai, que o fez se sentir incapaz. Ambos passam então por uma espécie de exorcismo, o primeiro expelindo sua raiva e o segundo jogando fora a baixa estima, enquanto são segurados pelos prisioneiros

Um problema notável, no entanto, é a falta de um contexto para seus personagens e algumas das informações dadas. A vida exterior de nenhum dos três visitantes é registrada, e não os vemos falar muito se não nas sessões de terapia. E, ao final do documentário, tem-se a informação de que todo prisioneiro que atendeu ao tratamento e foi liberto, nunca teve de voltar ao cárcere, alegando então a eficiência do método. Não seria interessante entrevistar ao menos um desses homens curados?

Apesar da falta de profundidade, O Trabalho ainda é uma experiência catártica, mesmo que difícil de assistir ou processar. Acabei me sentindo como o próprio Chris, de início tendo minhas diversas suspeitas e reservas, para no fim estar com os dutos de lágrima doloridos.

Caio Lopes

Formado em Rádio, TV e Internet pela Faculdade Cásper Líbero (FCL). É redator no Cinematecando desde 2016.

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