Crítica: 22 Milhas
Longa-metragem de ação dirigido por Peter Berg tem diversos lugares-comuns do gênero e é necessário fazer muita abstração para perceber nuances comportamentais dos personagens
Tiro, porrada, bomba e os EUA como os grandes mocinhos da humanidade. Essa é descrição de inúmeros filmes de ação e/ou de guerra, e pode ser usada com tranquilidade para falar sobre 22 Milhas.
Dirigido por Peter Berg, que já esteve à frente de filmes como Hancock e O Grande Herói, o longa retrata a arriscada ação de um grupo de elite e secreto da CIA para levar um informante indonésio, em um trajeto de 22 milhas, até um avião do governo estadunidense com destino ao país – o cara é um elemento-chave para ser possível encontrar e desativar bombas espalhadas em cantos diversos do mundo. Contudo, o que já tinha ares de missão de risco passa a ter contornos trágicos e análogos a uma guerra durante o percurso.
Além disto, não há muita coisa a dizer sobre a trama em si, uma vez que a narrativa remete à batida dicotomia em que os EUA combatem o mal, invariavelmente projetado em outro governo – neste caso, os russos são a bola da vez, pois terroristas do país são perseguidos pelos protagonistas nas primeiras cenas do longa. O ataque cibernético de hackers da terra de Vladimir Putin durante as eleições presidenciais em 2016 serve como argumento cinematográfico para uma trama paralela do filme, ao adotar ares de uma guerra online.
Se, por um lado, a história de 22 Milhas usa como muletas a violência pela violência e o famigerado bom-mocismo made in America, por outro, o longa-metragem usa as características comportamentais e, em certa medida, psicológicas dos personagens como recurso narrativo.
James Silva (Mark Wahlberg) é um soldado com capacidade cognitiva acima da média e que foi treinado desde criança para exercer a atividade pela qual é responsável. Todavia, ele parece ter sido transformado em uma máquina de guerra, pois em diversos momentos da trama parece não ter nenhum tipo de reação sensível a eventos extremos, como em mortes de colegas. Os poucos momentos nos quais é possível se lembrar de que ele é humano são em ataques de raiva e quando ele puxa um elástico colocado no pulso para aliviar a ansiedade e o estresse – e ele o faz diversas vezes na narrativa.
Alice Kerr (Lauren Cohan), braço-direito de Silva na equipe, é outra máquina de guerra e não tem pudores para recorrer à violência de modo gratuito – o que, em alguns momentos, pode até ser lido como uma espécie de autoafirmação sobre igualdade de gêneros. Ainda assim, um dilema familiar relacionado ao fato de estar distante de sua filha a faz ter acessos de fúria não raras vezes.
Outros, digamos, destaques do elenco são Ronda Rousey, que interpreta a soldado Sam Snow, cujos diálogos são econômicos em grande parte graças à atuação dela; o policial desertor Li Noor (Iko Uwais), informante do grupo de elite que recorre à violência para lutar pela própria vida, além de meditar nas horas vagas para manter a calma; e Axel (Sam Medina), autoridade local que é alçado ao posto de grande vilão da história – ou fazer o trabalho trabalho dele segundo a própria perspectiva. Isso sem contar Bishop (John Malkovich), chefe do grupo de elite, que é o representante da parte racional da história.
22 Milhas traz à tona a violência como ferramenta de trabalho e como escape da pressão psicológica, qualquer seja a dinâmica para tal. Afinal, é proibido ter sentimentos e conflitos psicológicos para fazer o que deve ser feito – seja lá o que isso signifique.