Crítica: Atypical (3ª Temporada)
O poder da compreensão e da aceitação
Inegavelmente, Atypical se tornou uma das séries sobre inclusão mais populares do mundo desde que sua primeira temporada foi distribuída pela Netflix em 2017. Primeiramente focada apenas em apresentar o cotidiano de seu protagonista Sam (e os cuidados de seus familiares e amigos próximos), um jovem autista que lida com as dificuldades mais inimagináveis possíveis, a série tinha pouquíssimo espaço para que os ótimos personagens secundários também brilhassem. Com isso, desde a segunda temporada o roteiro da série se dedicou cada vez mais em elaborar seus arcos secundários e abranger temas maiores, sem perder a inocência de Sam e a sutileza como trata o tema do autismo, ainda que tenha encontrado alguns problemas de ritmo que não existiam na temporada anterior.
Nesta terceira temporada, a principal roteirista e criadora, Robia Rashid, parece ter encaminhado de vez a série para uma jornada dramática e inspiradora sobre aceitação e até perdão, mantendo sua indispensável comicidade.
Com mais um ano que se inicia, Sam tenta se adaptar às exigências da faculdade, que se mostra muito diferente do colégio, e também passa a ter mais maturidade em seu relacionamento com Paige, que continua sendo uma das personagens mais caricatas da série, e também enfrenta problemas pessoais. Doug e Elsa continuam a tentar levar o casamento adiante e encontrar a melhor forma de lidar com seus conflitos. Enquanto Casey precisa lidar com uma escolha difícil que diz respeito à sua sexualidade e às pessoas que ama. A forma dinâmica e eficiente como a série também insere novos personagens e recorda dos antigos é algo surpreendente.
Retratando as mais diversas descobertas e conflitos da adolescência com leveza e bom humor, Atypical traça um caminho interessante de relação imediata e profunda entre o espectador e praticamente todos os personagens. Somos levados por uma onda de cenas fortemente comoventes, que são intensificadas pelas ótimas interpretações dos atores, com destaque para Keir Gilchris, muito bem ao transmitir as trejeitos de Sam, que embora se torne repetitivo e muitas vezes apático em certas situações, ainda satisfaz; e principalmente Brigette Lundy-Paine, que continua interpretando a melhor personagem da série (Casey) com uma variedade impressionante de expressões faciais, tom de voz e profundidade no olhar.
A série encontra espaço para contar um pouco do drama de quase todos os personagens, incluindo os arcos mais secundários possíveis, sem afetar o ritmo da história principal e sem permitir que percamos o interesse ao longo dos curtos episódios de em média 30 minutos. Agrada muito ver que o roteiro constrói situações em que não conseguimos “tomar um lado” em situações, pois compreendemos ambos os lados e nos identificamos com os todos os sentimentos em jogo. Mas está na complexidade emocional, nos dilemas e na forte relação entre os personagens que mora a maior qualidade de Atypical, que se encontra sem dúvidas, diante de sua melhor e mais bem estruturada montagem.
Ainda discursando sobre fidelidade, inclusão social, aceitação, autoconfiança, busca pelos próprios sonhos e diversas outras questões, a série demonstra muita maturidade e realismo para tratar seus temas de forma sensível. Além de trazer realidades facilmente palpáveis ao espectador, a série nos promove um olhar para nós mesmos, é uma reflexão sobre como todos nós somos (ou deveríamos ser) um pouco a-típicos à um mundo repleto de intolerância e ódio. Sem tentar ser o que não é, e usando sua linguagem audiovisual ao seu favor, Atypical se mostra uma obra de episódios emocionantes, quase didáticos, em um constante e delicioso humor que flutua durante os diálogos dos personagens com naturalidade.