Crítica: BoJack Horseman – 4ª Temporada

Crítica: BoJack Horseman – 4ª Temporada

Eu amo BoJack Horseman. Já BoJack Horseman, nem tanto. Não que o homem-cavalo seja um personagem ruim, muito pelo contrário. Ao longo de suas quatro temporadas, Horseman, dublado brilhantemente por Will Arnett, é construído de maneira assustadoramente… humana. À primeira vista uma sátira do ator tornado em playboy (não só necessariamente Charlie Sheen), BoJack Horseman tornou-se em um dos personagens mais fascinantes da peak TV americana. No entanto, o que torna BoJack Horseman, a série, essencial é todo o rico trabalho feito ao redor de seu personagem-título.

Criada por Raphael Bob-Waksberg em 2014, BoJack Horseman cambaleou em seu início. Tomando tempo para se distinguir das demais séries animadas adultas, a impressão era de que a Netflix estava mais uma vez emulando sua concorrência. Esse gosto inicial amargo afastou boa parte do público, que infelizmente não teve a chance de testemunhar a evolução da narrativa nos surpreendentes episódios finais. Para a sorte da série, porém, havia o suficiente para um boca a boca favorável, criando curiosidade sobre a próxima temporada.

E não é que deu certo? A 2ª temporada, lançada em 2015, recebeu críticas vertiginosamente positivas, elogiando seus elementos de sátira e principalmente a coragem de explorar, de maneira madura, em temas e verdades bastante sombrios (sobre Hollywood e o mundo). 1 ano depois, o padrão de excelência foi mantido, com uma 3ª temporada mais contemplativa e focada nas relações pessoais de seu elenco, terminando em revelações chocantes.

Nesta última sexta-feira, 8, foi a vez de sua 4ª temporada surpreender críticos e público. Pessoalmente, seu novo ano não demonstra a mesma consistência dos dois anteriores, mas, para o bem da série, questionei BoJack Horseman mais do que nunca. Não só por suas atitudes mal-pensadas ou desconsideração por seus mais fiéis amigos, mas por ser um reflexo de muitas das piores qualidades que um ser humano pode apresentar.

[Deixo aqui o alerta de que, se você não teve a chance de assistir BoJack Horseman em sua integridade, seguem alguns SPOILERS do final de sua 3ª temporada.]

Após uma tentativa de suicídio fracassada e a aparição de uma possível filha, Horseman está de volta a Hollywoo, agora decide viver uma vida mais discreta, mesmo tentado constantemente a sair da obsolescência. Hollyhock, a garota que acredita ser sua filha, é recebida por BoJack de maneira desafetuosa, assim como a mãe doente, Beatrice, que vive agora na casa de seu filho sem nem mesmo reconhece-lo. Tal dinâmica familiar tortuosa garante o peso dramático que distingue esta temporada das outras, culminando em uma sequência de episódios finais realmente desafiadores.

Contudo, como BoJack não se trata apenas de BoJack, temos uma série de subtramas que compõe o grosso da temporada. Algumas delas são excelentes, enquanto outras acabam repetitivas e até um tanto bobinhas. A melhor de todas, facilmente, é a aceitação de Princess Carolyn quanto a sua incapacidade de gerar filhos e seu comprometimento à carreira profissional. Encarnada pela excelente Amy Sedaris, PC se consolida como uma das mais ricas personagens atualmente na TV (ou em qualquer meio), mantendo-se essencial para uma série que, ironicamente, não carrega seu nome. Ainda no lado positivo, mesmo que moderadamente, há o arco de descoberta pessoal de Todd, dublado pelo irresistível Aaron Paul. Sempre envolvido nas situações mais caricatas da série, há um nível bastante agradável de maturidade em sua aceitação como assexual (uma denominação pouco discutida no entretenimento mainstream).

Por outro lado, há os arcos pouco focados de Diane e Mr. Peanutbutter. Apesar dos dois garantirem momentos e episódios inteligentes neste ano, seu arco juntos demora a atingir um ponto interessante. Nunca comprei muito a química entre os dois, e nesta temporada, em meio às repetitivas situações envolvendo a carreira política de Peanutbutter, fica a sensação de que Diane poderia ter feito mais (sua investigação de abusos sexuais e a colaboração com a popstar Sextina Aquafina, na 2a e 3a temporadas respectivamente, garantiram boa parte do prestígio midiático que a série recebe).

Nada que tire a força da experiência, no entanto. O foco dramático desta 4ª temporada é, de fato, BoJack e sua fragilizada família. Em um forte momento, sua filha lhe pergunta sobre quando a voz em suas cabeças, que os chama de feios e imprestáveis, enfim sumirá, apenas para que o pai, é claro, não esboçe uma clara resposta. São momentos inquietantes como esse que tornam BoJack Horseman em uma série inesquecível. Junto da ótima Rick and Morty, representa um novo patamar para as animações adultas. Fornecendo não só um maior insight de seu protagonista, como também do trágico passado de seu nome, BoJack se distingue e aprofunda com braveza seu estudo de personagens, lapidando uma das melhores narrativas televisivas destes últimos anos.

https://www.youtube.com/watch?v=v9yQv9YWFw4

Caio Lopes

Formado em Rádio, TV e Internet pela Faculdade Cásper Líbero (FCL). É redator no Cinematecando desde 2016.

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