Crítica: Bom Comportamento

Crítica: Bom Comportamento

Assim que Bom Comportamento tem seu início, a atenção já é conquistada. Somos imediatamente colocados no momento, com closes impactantes no rosto de Benny Safdie, um dos irmãos que dirigem o longa aclamado no Festival de Cannes.

Benny e Joshua Safdie, que por sua vez se mantém de trás das câmeras, simplesmente respiram cinema, demonstrando uma energia similar aos filmes de crime do final da década de 70 e início da de 80, trazendo memórias de Michael Mann e Walter Hill em sua representação crua do ambiente urbano. Conhecidos por operarem sob o estilo guerrilha (equipe pequena, poucos recursos, filmagens sem autorização), os Safdie agora provam, com Bom Comportamento, que conseguem transformar até uma estrela como Robert Pattinson em um sujeito nada glamoroso (e muito mais, é claro).

O enredo é simples, porém inteiramente envolvente. Os irmãos Connie (Robert Pattinson) e Nick (Benny Safdie) decidem roubar um banco para financiar uma viagem país afora. Coisas dão errado e Nick é preso, forçando Connie a procurar outras formas de conseguir o dinheiro, desta vez para pagar a fiança do irmão, que esteve sempre aos cuidados do outro por ser mentalmente limitado (aspecto que é retratado com profundo respeito). As próximas horas serão algumas das mais alucinadas (e fatídicas) que Connie terá vivido, deparando-se com uma série de personagens tão perdidos quanto ele.

Além das fortes interpretações, principalmente de Pattinson, e uma trilha enérgica (premiada em Cannes), são as capacidades narrativas dos Safdie que mantém a experiência cativante, mesmo em seus momentos de lentidão. Desafiando expectativas, os créditos iniciais ocorrem pela marca dos 15 minutos, apresentados no centro da tela em meio a uma sucessão de eventos, montados com excelente ritmo por Benny e Ronald Bronstein, que avançam a trama de maneira poderosa e inebriante. Essa força bruta não se sustenta a todo momento, mas sem alguns momentos de respiro, o longa poderia ter se tornado exaustivo.

Tecnicamente, Bom Comportamento é de um anacronismo marcante. Há imagens que parecem ter saído diretamente da década de 70: a fotografia de Sean Price Williams, por exemplo, é captada em 35mm bastante granulados e favorece uma iluminação naturalista, sem medo de ficar realmente escura nas muitas cenas noturnas (aliás, algo que aprecio tanto aqui quanto no polêmico mãe!, fotografado por Matthew Libatique, é a pouca luz, que pode render imagens muito mais críveis e atmosféricas). O som, por sua vez, foi captado em equipamentos analógicos, que contaminam os diálogos com o som ambiente, complementando bem as imagens sujas. Já a trilha eletrônica do músico Daniel Lopatin aka Oneohtrix Point Never traz agradáveis semelhanças aos trabalhos da banda Tangerine Dream, prolífica na década de 80, mas sem ficar apenas na homenagem, cumprindo também seu papel com a narrativa.

No entanto, assim como com o inesquecível Tangerine, o que faz de Bom Comportamento uma experiência de peso é a profunda empatia que seus diretores tem por Connie e Nick, completos outsiders, fechando o longa com uma cena sutilmente tocante ao som de The Pure and the Damned, composta por Oneohtrix e cantada por ninguém menos que Iggy Pop. É uma conclusão honesta, que comprova que os interesses dos Safdie vão muito além de patentear um estilo próprio. Fiquem de olho nesses moleques enxeridos.

Caio Lopes

Formado em Rádio, TV e Internet pela Faculdade Cásper Líbero (FCL). É redator no Cinematecando desde 2016.

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