Crítica: Carros 3
Vamos tirar algo do caminho: nunca entendi a existência da franquia Carros, muito menos o seu “conceito”. Iniciada em 2006, a série cinematográfica é uma das mais lucrativas para o aclamado estúdio Pixar, porém é também a menos popular com os críticos, atingindo seu ponto baixo com o fraquíssimo Carros 2, em 2011. Parecia uma mudança de ares para Pixar, ofuscada pela nova Disney Animation, responsável pelos sucessos Detona Ralph, Enrolados e Frozen. No entanto, o estúdio se reergueu lentamente até, em 2015, emplacar o grande fenômeno Divertidamente, reconquistando o público e a crítica. Pensava-se então que a Pixar apostaria em mais projetos e conceitos originais, deixando o passado no passado e mantendo-se à altura dos filmes Disney. Errado.
Seguindo a fórmula testada em 2016 com Procurando Dory, a Pixar decidiu jogar seguro novamente com reformulações de seus filmes de maior sucesso. Ora, até mesmo Toy Story, que recebeu um fim digno já em 2010, teve um quarto filme confirmado para o ano que vem. Contudo, a maior prova de acomodação do já tão audacioso estúdio veio com o anúncio de Carros 3, uma sequência que ninguém, nem mesmo os fãs, haviam pedido. Apesar do primeiro trailer com tom mais sombrio, no qual se vê o acidente sofrido por Relâmpago Marquinhos… não, McQueen (Owen Wilson), o ânimo para a estreia não era grande. Agora que o filme já saiu em território norte-americano e tem estreia nacional marcada para a próxima quinta-feira (13), ao menos posso dizer que o resultado é… razoável.
Como visto no mencionado trailer, o ponto de partida de Carros 3 é o acidente de Relâmpago McQueen, uma queda em sua reputação. No estilo dos filmes de retorno à glória, como Rocky Balboa ou até mesmo Zoolander, vemos um protagonista mais experiente, só que fora de sua melhores dias, encontrando um novo rival, mais jovem e arrogante, na forma de Jackson Storm, primeiro sinal de mudança na cena das corridas, o que leva Relâmpago a perder o controle em um circuito. Fora essa nova perspectiva, não há muito que diferencie este do longa original, a não ser por uma boa guinada em seu terceiro ato.
Tal guinada é possibilitada pela presença de uma nova personagem, Cruz Ramires (a comediante Cristela Alonzo). Ramirez é apresentada como uma nova personal trainer para Relâmpago, que tem a missão de recuperar a forma e ganhar de Storm em uma última corrida. Os papéis, no entanto, são gradualmente invertidos, e por mais que seus fins sejam previsíveis, é interessante ver essa pequena renovação em uma trama que, francamente, peca na largada.
Não fossem os minutos finais, Carros 3 assumiria a posição de longa mais inexpressivo já produzido pela Pixar. Apresentando seu conflito principal sem peso dramático, o roteiro se alonga excessivamente em seus primeiros dois atos, com poucos eventos realmente interessantes tomando a tela. Além disso, este terceiro longa possui (com exceção de uma corrida de destruição na lama) cenas de ação pouco inventivas, dando ao capítulo um leve ar de sequência home-video, apesar de uma boa trilha sonora do aclamado Randy Newman.
Ainda assim, o filme de Brian Fee, assumindo o posto de direção ocupado pelo veterano John Lasseter nos primeiros dois filmes, consegue fechar o círculo esboçado pelo primeiro longa. Ignorando completamente a trama à lá Bond de Carros 2, o terceiro capítulo resgata o vínculo entre Relâmpago e seu (supostamente falecido) mentor Doc Hudson (novamente com a voz de Paul Newman, em material não utilizado no original). A clareza temática do ato final, então, traz uma ligeira ressonância a Carros 3.
Voltando ao início: se você não guarda um semblante de interesse pelo “universo” de Carros, não há razões para conferir o longa além de matar 1h50 (!) de seu tempo. No entanto, caso tenha crianças e procura uma distração de fim de semana, posso garantir que Carros 3 é uma alternativa tolerável em comparação à cacofonia visual e sonora de um certo malvado favorito…
Ah, e infelizmente não há nenhuma subtrama sobre o chassi de Relâmpago McQueen ter sugado a alma de Owen Wilson para si, como sugerido pelo comediante Stephen Colbert em seu programa. Oportunidade perdida.