Crítica: Elis

Crítica: Elis

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Para muitas pessoas, ela foi a maior cantora brasileira de todos os tempos. Conhecida como “Pimentinha” e uma das precursoras da música popular brasileira (MPB), ela entoou, ao longo das décadas de 60 e 80, sua voz linda e poderosa em um país que vivia em choque com a ditadura militar, e acabou se tornando um símbolo de esperança. Em 2016, Elis Regina ganha uma cinebiografia decente, emocionante e, sobretudo, recheada de nostalgia para aqueles que acompanharam a trajetória turbulenta da artista, que faleceu precocemente em janeiro de 1982.

Do diretor Hugo Prata, Elis é um filme traçado em linha cronológica sobre a vida da cantora gaúcha e foca nos acontecimentos mais relevantes de sua carreira e seu lado afetivo. Vemos seus primeiros passos como artista ao chegar no Rio de Janeiro (no dia do golpe de 1964) com seu pai, o início da carreira no famoso Beco das Garrafas e os primeiros contatos com Luiz Carlos Miele e Ronaldo Boscoli. Também são abordados os relacionamentos que teve com Boscoli e César Camargo, o programa que dividiu com Jair Rodrigues (O Fino da Bossa), suas viagens internacionais, seu atrito com o governo militar, e a maternidade. Tudo isso é apresentado em 2h de filme e pode parecer até demais, mas realmente não é nem metade do que a artista viveu em seus intensos 36 anos de vida. O cuidado do diretor ao escolher e destacar justamente esse fatos faz com que seja impossível não ficar com um brilho nos olhos ao acompanhar Elis nas diferentes fases de sua vida.

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E esse brilho nos olhos, aliás, tem nome e sobrenome. Andréia Horta, atriz que deu vida à protagonista, está muito mais do que inspirada e traz a intensidade que era necessária para essa cinebiografia. Os cinco meses de preparação em que trabalhou especialmente seu corpo para exibir os trejeitos que Elis tinha, foram essenciais para tornar seu trabalho digno de aplausos (e de um prêmio de Melhor Atriz no Festival de Gramado 2016). A junção da voz original de Elis Regina com a interpretação forte de Andréia, que é cheia de sentimento, é de arrepiar. Ela soube dosar as nuances de comportamento da cantora, sua força no palco e insegurança fora dele, e entrou na personagem de uma maneira que é impossível tirar os olhos da tela, assim não se perde um segundo de Elis tanto no palco como na vida – sem esquecer da semelhança física, claro.

Assim como Horta, o elenco está bem entrosado com a trama e fica claro que Elis foi feito com muito carinho por todos que ali estavam envolvidos. Gustavo Machado interpreta o primeiro marido de Elis, o charmoso e malandro Bôscoli; Lucio Mauro Filho atua de forma natural como Miele (que era seu amigo próximo na vida real e que tinha um laço profissional muito forte com a cantora); e Caco Ciocler dá vida ao segundo marido e parceiro musical de Elis, César Camargo. Além destes atores, Ícaro Silva, que também fez Elis – A Musical, se destaca com sua breve participação como Jair Rodrigues, assim como Julio Andrade, na pele do coreógrafo americano Lennie Dale.

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A ambientação do Brasil nas décadas de 60/70 e a caracterização dos personagens estão excelentes e dão um toque especial ao filme. Parece que voltamos no tempo tanto pelas cores, roupas e programas de televisão, quanto pelo clima do país, uma vez que o regime militarista foi retratado de forma direta e crua, possuindo um espaço importante na trama por ter cruzado a trajetória de Elis em vários sentidos.

As canções que são tocadas no longa foram escolhidas a dedo por Hugo Prata. De 315 canções, apenas uma dúzia foram para o corte final e todas elas contribuem diretamente na narrativa, seja pelo aspecto cultural, pessoal ou político.

Apesar de que todo o cuidado – tanto em homenagear como em contar uma história – seja facilmente reconhecido em Elis, o filme peca em apressar os acontecimentos, tornando os cortes entre as cenas (e, principalmente, entre as fases da cantora) mais evidentes. Mesmo com tudo implícito, o desenvolvimento e ascensão de Elis foram abordados de forma rápida e fica a sensação de que faltou algo no meio, entre a Elis adolescente e a Elis confiante. Mas de certa forma também pode ser interessante pensar pelo outro lado e perceber que esse olhar condiz com a realidade, pois ela amadureceu rapidamente quando saiu do Sul e conquistou a fama.

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Contudo, nenhum defeito tira a relevância do filme ou o faz ser abaixo da média, porque ele é mais um exemplo incrível de como o cinema brasileiro merece ser visto, analisado e admirado. É um filme que possui qualidades no roteiro, na produção e, principalmente, na escolha do elenco. Tanto como cinema ou como homenagem, Elis dá muito certo.

Falar de Elis Regina é difícil, mas é ainda mais difícil fazer isso no cinema, pois sua figura é e sempre será importante para a cultura brasileira. Felizmente, Hugo Prata obteve sucesso em sua missão de adaptar a história dessa artista única. Seu primeiro trabalho como diretor de cinema com certeza emocionará muitos corações; tanto daqueles que já eram fãs da Pimentinha quanto daqueles que ainda não são tão familiarizados com o que há por trás de suas músicas.

FICHA TÉCNICA:
Direção: Hugo Prata
Roteiro: Hugo Prata, Luiz Bolognesi, Vera Egito
Elenco: Andréia Horta, Caco Ciocler, Gustavo Machado, Júlio Andrade, Lúcio Mauro Filho, Zecarlos Machado
Fotografia: Adrian Teijido
Montador: Tiago Feliciano
Ano: 2016
País: Brasil
Cor: Colorido
Estreia: 24/11/2016 (Brasil)
Distribuidora: Downtown Filmes
Estúdio: Bravura Cinematográfica

Barbara Demerov

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