Crítica: Era Uma Vez um Deadpool
A arte da autoironia
Motivos não faltam para Deadpool ter caído no gosto do público, cujo perfil é para lá de heterogêneo e composto por fãs das HQs do anti-herói e por quem não se ligava tanto no personagem até Ryan Reynolds trazê-lo à telona e ter levado às últimas consequências o mea culpa histórico pela polêmica versão de Wade Wilson em X-Men Origens: Wolverine.
Outro aspecto significativo para Deadpool ter se tornado um hit é o humor sem filtros e descompromissado, o que dialoga com a essência do personagem nos quadrinhos – quem nunca riu até perder o fôlego com alguma piada nos dois filmes que atire a primeira pedra. E era justamente a verve nonsense e isenta de pudores que restringia os longas-metragens do personagem ao público infanto-juvenil ou, digamos, à família.
Este é o plot de Era Uma Vez Deadpool, que consiste em uma espécie da versão do diretor com um pouco mais de filtros e ainda mais autoirônica. Na trama, o anti-herói sequestra Fred Savage – sim, aquele mesmo – e aproveita para lhe contar a sua história, baseada em Deadpool 2. A sequência do “novo” filme remete à produção A Princesa Prometida (1987), no qual Savage (o eterno Kevin Arnold, de Anos Incríveis) ouve o seu avô, interpretado por Peter Falk, ler um livro homônimo ao título.
A narrativa em si não tem tantas novidades – é uma releitura do segundo filme da franquia, vale relembrar -, mas tem como grandes méritos manter o humor descompromissado com purismos, o que é importante em tempos de conservadorismo crescente e obtuso, e a autoironia.
Este é, seguramente, o grande recado de Era uma Vez Deadpool: saber rir de si mesmo é fundamental para não nos tornarmos caricaturas tristes e opressoras de nós mesmos. Para começar, Savage topa rir de si próprio e não mostra melindres em se deixar ser transformado em alvo fácil de risadas. Ryan Reynolds, então, reforça esse lado, ao fazer referências às suas mal sucedidas empreitadas em X-Men Origens: Wolverine e em Lanterna Verde (2011) – herança de Deadpool 2 que foi mantida para a alegria e as risadas dos fãs.
Além destes aspectos, os produtores da saga do anti-herói mostraram que está tudo bem rir dos próprios trabalhos. Afinal, referências à fotografia e aos recursos cênicos são pratos cheios para comentários ácidos no longa, assim como citações a falhas do próprio roteiro.
Em resumo, não há muito a ser dito sobre os méritos cinematográficos de Era Uma Vez Deadpool, pois é um repeteco – releitura ou versão do diretor, como você queira chamar – do segundo filme do personagem tagarela. Ainda assim, o grande acerto do longa, que é uma constante na franquia de modo geral, é mostrar que rir de si mesmo é importante para levarmos a vida com mais leveza e para lidarmos melhor com problemas do cotidiano, além de ser um recurso importante para não nos tornarmos pessoas amarguradas e que se incomodam com a vida e a felicidade alheias.