Crítica: First They Killed My Father
“Se você não sabe nada sobre o Camboja e vir esse filme, você não vai apenas pensar que é um povo que sofreu com uma guerra. Vai perceber que estas são pessoas realmente interessantes, assim como suas raízes, suas personalidades, seu humor, seu amor à música e sua cultura.” – Angelina Jolie
Angelina Jolie se consagra na direção de filmes com uma obra fantástica. First They Killed My Father não é somente pesado em seu próprio título, como também possui uma abordagem profundamente melancólica e forte da guerra. Já vimos e ouvimos muito que guerras destroem lares, mas dessa vez o cinema nos apresenta uma história tocante vista pelos olhos de uma criança – mais precisamente de uma inocente e corajosa garota nascida em Camboja, no sudeste asiático. É como se tudo no filme tornasse as sensações de seus personagens palpáveis para o expectador. Você já vai entender.
Em uma adaptação do livro de Loung Ung “First They Killed My Father: A Daughter of Cambodia Remembers“, Jolie conta a história de sobrevivência de Ung durante regime do Khmer Vermelho, no Camboja, um período que durou quatro anos e culminou na morte de dois milhões de pessoas. Quando ainda criança, sua família foi separada, e ela acabou sendo treinada como soldada mirim em um campo para órfãos, enquanto seus seis irmãos foram enviados a campos de trabalho forçado. O drama não se prende apenas à afetividade familiar, mas também expõe todos as dificuldades vividas pelo povo durante o período, contornando os esforços físicos, o desespero pela busca de comida, a submissão ao regime e a humilhação.
No filme, não há um aprofundamento dos personagens, mas sim de suas condições físicas e psicológicas, visto a conturbação organizacional que se constrói. O roteiro abre espaço para que a jovem protagonista brilhe e traga em seu olhar o poder de sugestão necessário para cada cena, algo em que a atriz mirim Sareum Srey Moch se sai muito bem.
Com uma diversificada e original decupagem de planos, a direção de fotografia (executada pelo já conhecido Anthony Dod Mantle) trabalha muito bem com a percepção do expectador. Apesar da predominância estática e subjetiva (ou de movimentos lentos) da câmera, cada movimento não servem apenas para criar dinamismo, mas sim para criar uma intimidade com os personagens, apoiando-se em enquadramentos fechados (closes) e até planos gerais (abertos) em movimento, refletindo o cansaço do povo em trabalho forçado no vilarejo.
Sendo um filme composto mais pelo silêncio do que qualquer coisa, First They Killed My Father não abusa da montagem (que por sua vez cumpre com seu papel), e se constrói em cima de um design de produção arrebatador, com figurinos uniformes, cenários vazios e maquiagem naturalista. A trilha musical de Marco Beltrami é econômica, fazendo-se presente apenas quando necessária, ocasionalmente crescendo e ganhando maior enfoque.
O roteiro co-escrito por Jolie e Ung não traz grandes inovações, permitindo que se conte a emocionante história através de imagens. Pela importância histórica, seu aprofundamento técnico e maturidade temática, o drama é sem dúvidas um dos melhores filmes do catálogo de originais Netflix. Suas mais de duas horas de duração demandam paciência e seu tema exige sensibilidade, mas desde que o espectador esteja apto a se emocionar com a trajetória de Loung Ung, é garantido que os sentimentos dos personagens, transmitidos através de suas ações, olhares e lágrimas, serão marcantes.
FICHA TÉCNICA
Direção: Angelina Jolie
Roteiro: Loung Ung, Angelina Jolie
Produção: Angelina Jolie, Rithy Panh
Elenco: Sareum Srey Moch, Kompheak Phoeung, Sveng Socheata, Chenda Run
Direção de Fotografia: Anthony Dod Mantle
Montagem: Xavier Box, Patricia Rommel
Música: Marco Beltrami
Gênero: Drama
Duração: 136 min.
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