Crítica: Marshall – Igualdade e Justiça
O astro Chadwick Boseman faz seu melhor em cinebiografia previsível de Thurgood Marshall
Este filme fez parte da programação oficial da 41ªMostra Internacional de Cinema em São Paulo.
Que Chadwick Boseman é uma presença carismática, muitos sabem. No entanto, poucos sabem quem foi Thurgood Marshall, primeiro advogado negro a se tornar membro da Suprema Corte dos Estados Unidos. É no mínimo oportuno, então, que o primeiro interprete o segundo em uma cinebiografia hollywoodiana.
Com direção de Reginald Hudlin, que até aqui só havia feito comédias, Marshall – Igualdade e Justiça é daqueles dramas que hora ou outra figuram no Oscar mas que saem por aqui em home-video (estranho caso de Guerra ao Terror). Indicado na categoria de Melhor Canção, com Stand Up for Something, é um filme de temática forte e atual, relatando o tempo em que Marshall escolheu defender Joseph Spell (Sterling K. Brown), homem negro acusado de estuprar uma mulher branca, interpretada por Kate Hudson. Por isso, o longa tinha tudo para ser uma dinamite cinematográfica, mas infelizmente acaba sendo um tanto protocolar demais.
Quando se trata de histórias reais, principalmente as de mistério policial, é possível criar suspense genuíno com algo que alguns já saibam como irá terminar. Vôo 93 exemplifica o ápice disso. Marshall, por sua vez, deixa seu enredo previsível ao apostar nos lugares comuns de uma cinebiografia inspiradora: monólogos e discursos bonitos, uma grande queda seguida de redenção, o demanche e depois a reconciliação com o parceiro advogado Sam Friedman (Josh Gad), entre outros. Os artifícios então acabam por entregar demais as intenções do longa, que por outro lado, apresenta uma premissa que se beneficiaria de áreas cinzentas.
Tentando emular filmes clássicos do tipo além de exuberantes dramas de época recentes, o diretor Hudlin joga tudo no 11. Há travellings e planos longos de sobra, além da típica composição de cena que posiciona atores de acordo com a relação de poder entre personagens. Isso é, quando o roteiro de Jacob e Michael Koskoff traz tais dinâmicas à mesa. Sem muitos desdobramentos que renovem a narrativa, as instâncias dentro do tribunal acabam apresentando uma linguagem visual repetitiva, tendo alguma evolução apenas na reta final, quando Marshall e Friedman aprendem novas e cruciais informações do caso.
O texto dos irmãos Koskoff também falha em um campo importante: o de investigar a pessoa por trás do mito. São pouquíssimas as cenas em que a pessoa Marshall se apresenta como complexa, encoberta numa barragem de frases feitas e, sim, uma mitificação excessiva. É sempre muito mais inspirador quando vemos que uma figura tão importante também viveu momentos mundanos e imperfeitos durante uma cruzada dessas, e os dilemas enfrentados durante a defesa de Spell poderiam ganhar dimensões dramáticas muito mais impactantes. Isso também se deve ao fato de metade do tempo ser dedicada a desenvolver a vida pessoal de Friedman… vai entender o porquê disso em um filme cujo título é Marshall.
O pouco de impacto que Marshall – Igualdade e Justiça tem, sem dúvidas, vem das interpretações esforçadas de Boseman e Brown, cuja expressividade casa perfeitamente com a atmosfera clássica pretendida. Na sua intensidade controlada, Boseman faz o seu melhor com um material clichê, deixando palpável o comprometimento pessoal de Thurgood com o caso. Já Brown aproveita o pouco de seu tempo em tela e transforma seu Spell em uma figura igualmente trágica e misteriosa, sendo uma presença sempre marcante. Não que o restante do elenco majoritariamente branco (que conta também com Dan Stevens) entregue más atuações, mas apenas não brilham em suas cenas (inclusive Gad).
Com elegante fotografia de Newton Thomas Siegel e figurinos da aclamada Ruth E. Carter, Marshall – Igualdade e Justiça tem certamente a cara de um grande filme, e para alguns até o seja. No entanto, com uma história e um legado de tamanho peso por trás de seu enredo, espera-se um bocado a mais de força de seu roteiro, que perde a oportunidade de investigar feridas sociais e se aprofundar na pessoa que lhe deu nome.
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