Crítica: Suburbicon – Bem-vindos ao Paraíso

Crítica: Suburbicon – Bem-vindos ao Paraíso

Em seu sexto filme como diretor, George Clooney se vê indeciso entre tons e ideias que não misturam

Há roteiros que, com a direção certa, resultam em excelentes filmes. Suburbicon – Bem-vindos ao Paraíso, originalmente escrito pelos irmãos Joel e Ethan Coen, não é um destes exemplos. Cogitado como volta à forma do diretor George Clooney após o fracasso de sua comédia Caçadores de Obras-Primas, o filme estreou no Festival de Veneza deste ano e não foi recebido da maneira mais favorável. Apesar dos aspectos mais promissores, é fácil perceber porque.

Como se sabe, grande parte dos projetos autorados pelos Coen exigem precisão ao navegarem por tons distintos, indo da comédia à tragédia em um piscar de olhos e com grande dose de humor negro. É admirável a tentativa de Clooney de embarcar em uma produção fora de sua zona de conforto, mas infelizmente sua condução acaba falhando assim como o próprio roteiro, que revisou com seu colaborador frequente Grant Heslov.

Não me entendam mal: há muito de interessante em Suburbicon. Seu retrato de um subúrbio branco e de classe média é inicialmente ácido e seu elenco, que conta com Matt Damon (Jason Bourne), Julianne Moore (Kingsman: O Círculo Dourado) e Oscar Isaac (Star Wars: Os Últimos Jedi), é como sempre confiável. Há também algumas boas sacadas no próprio roteiro, incluindo uma situação de “arma de Tchekhov” (um item primeiramente apresentado e posteriormente utilizado) que surte bom efeito. No entanto, o longa se perde constantemente entre tons que não misturam, além de contar com personagens nada carismáticos, um excesso de diálogos pedestres e uma mensagem política que, muitas vezes fora de foco, perde seu impacto.

O filme segue a história de Gardner Lodge (Damon), pai de família que se vê em uma tensa situação com dois criminosos, responsáveis pela morte de sua esposa. Vivendo com a cunhada (Moore) e seu filho (Noah Jupe, um dos pontos altos), deve encontrar uma maneira de resolver o problema antes que se agrave. Pelo menos é isso que os trailers procuram transmitir.

Devo dizer: a divulgação de Suburbicon está de parabéns por manter 100% de suas surpresas em completo sigilo, incluindo o próprio desenvolvimento da trama. As expectativas são subvertidas e o público pode se surpreender nesse sentido, mas após alguns minutos, já dá para sentir algo de errado. Quem está habituado aos filmes dos Coen pode estranhar a condução menos segura do texto, em cenas que deveriam criar tensão mas que apenas não envolvem. Há também uma subtrama que percorre o filme como comentário político, mas sua pertinência é infelizmente diluída em meio a todas as outras partes.

De um ponto de vista técnico, Suburbicon agrada, porém menos que o esperado. A fotografia de Robert Elswit incorpora bem a estética 50s, com cores vivas e movimentos de câmera clássicos, e o design de produção de James D. Bissell convence em sua simplicidade, sem exagerar no retrato da época. Contudo, a trilha-sonora composta pelo renomado Alexandre Desplat é um tanto genérica, além de intrusiva. Por exemplo, um momento de suspense no terceiro ato é sacrificado pelo uso desnecessário da música, que torna o momento mais cartunesco do que deveria ser. Uma sucessão de deslizes como esse fazem o filme perder sua força.

Tendo feito os ótimos Confissões de uma Mente Perigosa e Tudo Pelo Poder, George Clooney certamente tem ambições como diretor e roteirista, e é uma pena vê-lo se perder neste filme. Na pretensa de transmitir uma mensagem edificante sobre classe e raça mas também realizar uma comédia violenta e despretensiosa, acabou indeciso entre dois filmes completamente diferentes. “Em cima do muro” é uma boa definição para Suburbicon – Bem-vindos ao Paraíso.


Trailer

Caio Lopes

Formado em Rádio, TV e Internet pela Faculdade Cásper Líbero (FCL). É redator no Cinematecando desde 2016.