Crítica: Ted Bundy – A Irresistível Face do Mal
Entre a elegância e a monstruosidade
Explorar a psicologia e os relatos biográficos de famosos assassinos é sempre um tiro certeiro para os produtores e cineastas de Hollywood. De fato há público para isso, e uma vasta área de exploração dentro dessa temática. Conhecido como um dos assassinos mais perversos de todos os tempos, não é a primeira vez que o estadunidense Ted Bundy tem sua vida, (ou pelo menos seus crimes) retrada pelo audiovisual. Entre os mais evidentes se encontram o filme de 2002, dirigido por Matthew Bright, e a recente minissérie da Netflix chamada Conversando com um Serial Killer: Ted Bundy. Porém, a proposta deste novo filme é bem distinta, numa busca pela humanização do assassino, com enfoque em seu duplo caráter e em sua manipulativa e curiosa relação com sua ex-noiva, Elizabeth Kloepfer, ou também conhecida por seu pseudônimo, Liz Kendall.
De início, um convincente design de produção nos joga para o final da década de 60, quando Liz (Lily Collins) conhece Ted (Zac Efron) em um bar. Aos poucos vamos nos familiarizando com o relacionamento de ambos e com a influência que Ted exerce sobre Liz. O roteiro aposta em uma abordagem intimista do protagonista, mas realiza isso de forma superficial. Acompanhamos o personagem, até então estudante de direito, em suas leituras na biblioteca, sem que saibamos o que exatamente lê. Notamos seu comportamento misterioso no trânsito e sua frequente ausência na casa de Liz, que já o namora. Vemos os anúncios dos crimes supostamente cometidos por Ted, mas não o vemos cometer nenhum. Toda essa superficialidade é intencional, construída para nos aproximar do lado carismático de Bundy, que funciona para propor algo próximo de dúvida ou misericórdia pelo assassino, mas perde parte do grande potencial que a história tinha de explorar a psicologia do personagem.
Se afastando de um caráter documental, Ted Bundy: A Irresistível Face do Mal nos envolve em uma trama que conhecemos o final, porém não sabemos a fundo as influências das pessoas e dos pensamentos de Ted nas atitudes que levaram a história terminar como terminou (algo como a proposta da série Bates Motel, porém muito menos elaborada). Somos presenteados com interpretações interessantes, desde atores coadjuvantes como Kaya Scodelario, Jim Parsons, John Malkovich e Haley Joel Osment, que apesar do pouco tempo em tela conseguem alcançar as expectativas, até Lily Collins que traz realismo com um trabalho controlado de angustia e um sentimento de culpa.
Mas o maior crédito, tanto nas atuações quanto do próprio filme no geral, vai obviamente para Zac Efron, que carrega o protagonista com uma variação de expressões impressionante, ora amedrontadora, sugerindo dúvidas a respeito de seu caráter, ora simpática para convencer e manipular a quem bem entende. Sua interpretação é o que mantém o público preso à narrativa e curioso sobre o funcionamento da mente do personagem. É o que nos faz questionar a todo tempo como é possível um homem, que além de se auto representar como próprio advogado, encantar tanto a mídia e parte da população com sua desenvoltura.
A direção de Joe Berlinger garante um envolvimento natural do público, com dinamismo nas horas certas e o ritmo necessário para que o enredo flua e nos acrescente cada vez mais informações sobre o protagonista. O roteiro por sua vez, é quem mais peca ao querer abocanhar um pedaço de bolo maior do que deveria. Tentando intercalar entre o sofrimento de Liz, a busca por liberdade de Ted, a história não se sustenta por não se dedicar em realizar uma coisa de cada vez. E além de tomar um bom tempo insistindo nesse equilíbrio de atenções, o enredo deixa de focar em questões indispensáveis (que por sinal até a minissérie da Netflix deixou de fora) na história de Bundy, como por exemplo seu fascínio por necrofilia e a forma como capturava suas vítimas.
Com todos seus erros e acertos, o novo e mediano filme sobre o assassino não fica abaixo da média, e possui qualidades suficientes para prender nossa atenção, nos fazer ansiar pelo final, e nos provar que Ted Bundy não foi somente um dos primeiros e mais televisionados julgamentos da história do Estados Unidos. Sua profunda recusa em admitir seus atos, sua audácia perante o juiz e demais autoridades, seu tom irônico e sua capacidade de controlar as pessoas o fizeram mais de um simples assassino, e o tornaram de fato uma das personalidades mais conhecidas dentro do universo criminal.