42ª Mostra – Crítica: Família Submersa

42ª Mostra – Crítica: Família Submersa

Sufocamento domiciliar

critica Familia Submergida

Chega a ser difícil para os personagens do argentino Família Submersa não se esbarrarem. No apartamento onde moram, povoado pela mãe, pai e três adolescentes, há sempre objetos espalhados, louças empilhadas na pia à espera de serem lavadas e um acúmulo de plantas. A sensação é que é difícil até respirar ali.

A câmera, que acompanha tudo de muito perto, e o ambiente construído pela cineasta estreante em longas-metragens María Alche lembra o estilo dos primeiros filmes de outra diretora de seu país, Lucrécia Martel. Não é apenas coincidência: Alche foi a atriz principal de A Menina Santa (2004), um dos trabalhos mais consagrados de Lucrécia.

São muitos os pontos de intersecção entre os dois longas. A intimidade quase invasiva com a qual o público é convidado a espiar o cotidiano daquelas pessoas é uma delas. Outra é a sugestão de eventos fantásticos, que no caso de Família Submersa se misturam à realidade da protagonista, Marcela, interpretada por Mercedes Morán, também atriz importante da filmografia de Lucrécia, com quem trabalhou em O Pântano (2001).

Esta mulher de meia-idade, que acaba de enterrar a irmã, tem devaneios onde se vê rodeada por antigos parentes, cujas presenças e lembranças contribuem para sua sensação de sufocamento.

Há ainda as preocupações do dia a dia: a filha que acaba de terminar um namoro, o filho que tem lições particulares. Marcela tem a chance de sair um pouco desta atmosfera carregada quando conhece Nacho (Esteban Bigliardi), rapaz mais jovem que se encontra numa espécie de hiato quando descobre que sua mudança para o exterior por conta de um novo trabalho terá de ser cancelada.

Aos poucos os dois vão se aproximando, como para viver um momento de suspensão em suas vidas, e é em alguns de seus passeios que o filme sai dos cenários de quatro paredes para ambientes exteriores, ainda que de forma breve.

Há nas situações descritas no roteiro também escrito por Alche algo de surrealista, enquanto sua linguagem estética pende para o naturalismo. A mistura causa uma estranheza bem-vinda, que aliada com a força da atuação de Mercedes Morán, mantém Famíla Submersa ecoando na memória muito tempo depois da sessão.

Diego Olivares

Crítico de cinema, roteirista e diretor. Pós-graduado em Jornalismo Cultural. Além do Cinematecando, é colunista do Yahoo! Brasil

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