42ª Mostra – Crítica: Infiltrado na Klan

42ª Mostra – Crítica: Infiltrado na Klan

Spike Lee dá sua resposta aos EUA de Trump

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A escalada do racismo nos EUA como consequência da vitória de Donald Trump na eleição presidencial de 2016 serviu de combustível para Spike Lee voltar ao modo pé na porta, com Infiltrado na Klan. Não exatamente que nos anos anteriores o cineasta tenha desacelerado, mas agora há mais gente disposta a ver um filme que demonstra o óbvio: igualdade racial ainda é um ideal longe de ser alcançado e a luta para isto mudar deve ser diária.

Não que este fosse o propósito fundamental do protagonista, Ron Stallworth (John David Washington). Ele entra para a polícia do estado do Colorado motivado pela vontade de ser um bom guardião da lei, mesmo que para isso tenha que aguentar provocações dos colegas da corporação por ser o primeiro negro ali. Porém, quando é destacado para acompanhar o comício de um ativista da causa racial, Ron tem seu despertar e percebe que a própria existência já é uma forma de resistência. Sendo assim, elege como alvo de sua próxima investigação a Ku Klux Klan.

Trabalhando ao lado de um colega judeu (interpretado por Adam Driver), responsável por representá-lo nas reuniões presenciais, ele mergulha nas entranhas de uma associação criada para exterminar qualquer um que não seja “o norte-americano puro”.

Como numa charge política que transforma os opressores em caricaturas ridículas, o filme não faz cerimônia em partir de um caso verídico para transformar seus vilões em personagens patéticos. Isto é dado desde o começo, quando Alec Baldwin faz uma ponta como um sujeito vaidoso e desajeitado, responsável por gravar um vídeo sobre os “perigos” da miscigenação entre as raças. A escalação de Topher Grace (da série That 70’s Show) como o líder da KKK é outra tiração de sarro, já que o ator tem a mesma capacidade de soar assustador do que um filhote de chihuahua.

Spike Lee sabe que está pregando para convertidos e não se importa. Quer proporcionar algum tipo de catarse para quem historicamente foi – e continua sendo – vítima de perseguição moral e física.

Tivesse sido lançado durante o governo de Barack Obama, é provável que a repercussão do longa seria bem diferente. Ao estrear em 2018, a mensagem bate forte, e não por acaso. Há no filme frases que se assemelham ao “Make America Great Again” do slogan de Trump e, como se não bastasse, um encerramento com cenas da passeata de grupos de supremacistas brancos ocorrida em Charlottesville, em agosto de 2017.

Até chegar neste epílogo de gelar a espinha, Infiltrado na Klan poderia ser confundido por um espectador menos atento com uma comédia de ação nos moldes do recente Dois Caras Legais, por exemplo. Spike Lee faz um trabalho tão bom em equilibrar tensão e diversão, embalado por uma trilha sonora envolvente de soul music, que o filme poderia ser “só” cinema de entretenimento. As imagens reais são um duro lembrete de que há muito mais em jogo ali.

Diego Olivares

Crítico de cinema, roteirista e diretor. Pós-graduado em Jornalismo Cultural. Além do Cinematecando, é colunista do Yahoo! Brasil

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