43ª Mostra – Crítica: System Crasher

43ª Mostra – Crítica: System Crasher

Infância em combustão

Há um ditado de origem africana e bastante conhecido ao redor do mundo que diz: “é preciso uma vila inteira para criar uma criança”. A expressão dá a medida de que a responsabilidade de cuidar de meninos e meninas durante a infância não cabe apenas aos pais, mas é de todos que estão no entorno. O drama alemão System Crasher mostra como esse desafio pode ser extenuante.

Vencedor do Urso de Prata no último Festival de Berlim, o filme acompanha a garotinha Bennie, de 9 anos, criança que vai passando de lar adotivo a lar adotivo sem conseguir se adequar a nenhum deles. Dada a surtos violentos de agressividade, ela é o terror das creches por onde passa. No fundo, porém, há muita carência de amor familiar, já que sua mãe negligente prefere se manter afastada.

Em seu segundo longa-metragem de ficção, a diretora Nora Fingscheidt demonstra um vigor impressionante. Também responsável pelo roteiro, ela constrói uma narrativa que alterna picos de euforia e tristeza, de acordo com as oscilações de humor de sua jovem protagonista. Assim, é possível num corte pular de uma cena com música agitada e alta para em seguida mergulharmos num momento silencioso, introspectivo.

A interpretação da pequena Helena Zengel como Benni surpreende pelas nuances, indo da extrema vulnerabilidade para a encarnação de um pesadelo. Seu principal parceiro de cena é Albrecht Schuch no papel de Micha, profissional responsável por intermediar às idas da menina a escola e que, por ter uma identificação com “crianças-problemas”, acaba desenvolvendo uma ligação emocional responsável por alguns dos momentos mais tocantes do filme.

Assim como O Jovem Ahmed, outro longa recente cujo protagonista é uma criança capaz de atos extremos, ainda que por uma motivação bem diferente, System Crasher não está interessado em oferecer uma solução para o problema. Sua intenção é questionar quem é capaz de dar suporte quando a estrutura familiar falha e a incapacidade da sociedade em lidar com comportamentos que fogem do esperado.

Diego Olivares

Crítico de cinema, roteirista e diretor. Pós-graduado em Jornalismo Cultural. Além do Cinematecando, é colunista do Yahoo! Brasil