Crítica: Escobar – A Traição
Baseado em livro sobre affair de Pablo Escobar e Virginia Vallejo, filme não é brilhante, mas entrega o que se propõe a fazer
Falar sobre Pablo Escobar virou um dos grandes lugares-comuns do audiovisual nos últimos tempos. Além de Narcos, em que Wagner Moura interpretou “El Patrón” por duas temporadas, o narcotraficante colombiano foi retratado também, entre outras obras, na série Pablo Escobar: O Senhor do Tráfico, no longa Escobar: Paraíso Perdido e até em Conexão Escobar – aqui vale um parêntese: nesta última obra, cujo nome nos EUA é The Infiltrator e é protagonizada por Bryan Cranston, Escobar não é o protagonista.
Pois bem, ao dar sequência à overdose (!) de Pablo Escobar, vamos ao longa Escobar – A Traição, dirigido por Fernando León de Aranoa e coprotagonizado por Penélope Cruz e Javier Bardem.
Baseada no livro Amando Pablo, Odiando Escobar, escrito pela jornalista Virginia Vallejo sobre o affair que ela e “El Patrón” tiveram por anos, a película aproveita-se da narrativa em primeira pessoa para contar o caso entre Vallejo e Escobar, assim como os anos em que o narcotraficante comandou o Cartel de Medellín e aterrorizou a Colômbia até ele ser morto, em 1993.
É a partir deste ponto que alguns dos pontos altos da trama vêm à tona. Primeiro, se Wagner Moura roubou a cena em Narcos graças à abordagem dada a Escobar, que flertava com a sensibilidade em alguns momentos, mesmo em meio à barbárie, a abordagem que Bardem deu ao criminoso é mais bruta e crua, o que já fica visível logo na primeira cena na qual aparece. A atuação do espanhol, irreconhecível à primeira vista na pele do personagem histórico, é um dos pontos altos da trama.
Outro aspecto a ser destacado é a atuação de Penélope Cruz na pele de Virginia Vallejo, que é propositalmente exagerada na maior parte do filme. Vá lá, a jornalista parece ser uma personagem criada por Pedro Almodóvar, mas está longe de ser caricata – o que é um mérito grande de Cruz. As hipérboles são importantes para o desenrolar de Vallejo na trama e para o filme propriamente dito, seja em cenas que mostram a relação sem filtros e intensa entre ela e Escobar, seja nos momentos em que a derrocada dela é acentuada no decorrer da história.
Aliás, a relação entre Pablo Escobar e Virginia Vallejo evidencia mais uma dicotomia na personalidade contraditória e ambivalente do narcotraficante. Se a relação extraconjugal entre ele e Vallejo era à flor da pele e essencialmente carnal, o casamento dele e Maria Victoria Henao (Julieth Restrepo) era marcada pela devoção e, se é que vale usar o termo a seguir, respeito. Diga-se de passagem, os elos familiares trazem à tona o lado vulnerável de Escobar em diversos momentos da trama, o que é acentuado conforme a trama se desenrola e o poder do Cartel de Medellín escorre pelas mãos dele – idem a idolatria da parcela pobre da população da cidade onde estava a sua base, convertida em medo e ódio com o passar do tempo.
Episódios fundamentais sobre a narrativa de Escobar, como o atentado que culminou na explosão do voo 203 da Avianca, em 1989, no qual 107 pessoas foram mortas, atentados diversos de autoria dele nos quais diversos civis foram mortos, e as brutais mortes dos narcotraficantes Fernando Galeano e Kiko Moncada na prisão La Catedral, em 1992, ajudam a dar a dimensão do lado psicopata de “El Patrón”, além de retratarem a perspectiva histórica sobre como esses fatos afetaram as vidas dele e de Virginia Vallejo.
Em resumo, Escobar – A Traição está distante do que se pode considerar uma obra-prima, até pela quantidade de obras sobre Pablo Escobar. Ainda assim, a narrativa ágil da trama, a direção correta de Fernando León de Aranoa, e as atuações boas do casal Cruz e Bardem fazem do filme uma obra que vale a pena ser conferida.