Crítica: Pequeno Demônio
A julgar pelos últimos lançamentos da plataforma de streaming Netflix, que incluem Death Note, Onde Está Segunda e O Nevoeiro, fica aquela amarga impressão de que o serviço se tornou um guarda-volumes para projetos mal-fadados. Nesta sexta, 1º, a estreia em destaque é a comédia de terror Pequeno Demônio, protagonizada por Adam Scott e Evangeline Lilly. Confesso que tinha poucas esperanças a respeito, principalmente devido ao fraco trailer. Ainda assim, dei a conferida pelo fato de seu diretor, Eli Craig, ter surpreendido os fãs de terror alguns anos atrás com o criativo Tucker e Dale contra o Mal. Pessoas, preciso dizer… estou orgulhoso de ter dado a chance a Pequeno Demônio.
A premissa inicial é básica: Gary (Scott) está recém-casado com Samantha (Lilly), mãe do pequeno Lucas (Owen Douglas). Desde o início, o padrasto suspeita que o garoto esconda um segredo sombrio, apenas para ser levado a acreditar que se trata do anticristo em carne e osso. Com a ajuda da melhor amiga Al (Bridget Everett, Patti Cake$), Gary começa a investigar a história por trás da existência de seu afilhado. Coisas malucas acontecem. Entregar mais que isso arruinaria o ponto do filme.
Logo de cara, as influências tomadas pelo diretor Craig ficam bem claras: os zooms lentos evocam os longas de terror da década de 70 (mais especificamente, A Profecia), enquanto o uso constante de smash cuts como transição entre cenas explicita a admiração de Craig pela obra de Edgar Wright. Nas mãos erradas, tal tipo de emulação poderia ficar forçada ou até mesmo vaidosa, porém Craig, como o cineasta inteligente que é, sabe aproveitar os estilos apenas nos momentos que os exigem. Contribuindo ainda mais para o valor estético do filme, a fotografia de Matthew Clark traz composições imagéticas muito bem trabalhadas, evocando diversos momentos icônicos de filmes de terror famosos sem criar inconsistências ou diluir a originalidade do longa.
Trabalhando com um roteiro assinado pelo próprio Craig (quem diria que ainda existem comédias criadas por apenas um único roteirista!), o elenco confere uma personalidade ainda maior à história. Scott (de Parks and Recreation) está carismático e suave como sempre, enquanto Lilly também entrega uma boa atuação apesar da falta de situações criativas que a envolvam. Quem rouba a cena aqui, sem dúvidas, é a comediante Everett, que faz uma bela demonstração de seu singular timing cômico, garantindo momentos hilariantes que, evitando a apelação, deixam o espectador apreciá-los de maneira natural. Além desses três, há também uma leva de boas participações, que incluem Donald Faison, o eterno Turk da série Scrubs, e o pouco visto Tyler Labine, o Dale de Tucker e Dale. Há ainda algumas pontas que vão agradar os fãs de terror e cinema no geral, mas claro que não vou entregá-las aqui.
A faceta mais surpreendente de Pequeno Demônio, contudo, é sua maturidade. Assim como Tucker e Dale, Pequeno Demônio recebeu um trailer muito aquém de seus méritos. Enquanto o caso do primeiro era um tanto mais grave, com o trailer entregando quase todos os momentos mais criativos do longa, a divulgação do segundo feita pela Netflix fez o projeto parecer um tanto juvenil demais, além de um pouco genérico. É uma pena que trailers possam influenciar tanto a disposição do público, pois Pequeno Demônio faz coisas interessantíssimas com seu conceito assim que chega em seu terceiro ato. Não vou falar exatamente o quê, mas posso afirmar que é bom ver como Craig injeta emoção de maneira tão honesta em sua comédia.
Com uma duração veloz de 94 minutos, Pequeno Demônio representa uma boa retomada de fôlego para o catálogo de originais Netflix. Sua superfície pode não dizer muito à primeira vista, mas o filme de Eli Craig é exatamente aquilo que o público casual procura em uma noite de sexta-feira: uma diversão sincera. Nesses quesitos, portanto, Pequeno Demônio é uma das surpresas mais agradáveis de 2017.
Pequeno Demônio já está disponível na Netflix. E é muito melhor do que o trailer abaixo faz parecer.
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