Crítica: A Casa do Medo – Incidente em Ghostland
Sobre conflitos e loucuras
O diretor francês Pascal Laugier já provou que sabe brincar com conflitos internos e externos, além de realizar muitas cenas pesadas (graficamente e narrativamente). Seu longa Mártires (2008), ainda que divida opiniões da crítica, é a evidência disso. Porém, ao se arriscar em um thriller psicológico franco-canadense com temas como invasão domiciliar e problemas mentais, seria necessário trazer ao menos alguma inovação temática que sustensasse sua história. Infelizmente, o cineasta parece não ter cumprido com isso. Nosso envolvimento oscila diante de uma história mal amarrada e pouco original, enquanto nos impactamos apenas com uma ceninha ou outra.
Em Ghostland (título original do filme), acompanhamos Pauline e suas duas filhas, que herda uma casa de sua tia. Na primeira noite na nova casa, as três são surpreendidas por intrusos assassinos e tentam lutar por suas vidas. Dezesseis anos depois, quando as filhas se reúnem na casa, coisas ruins e estranhas começam a acontecer. Nesse meio, a filha mais nova, Beth (Emilia Jones/Crystal Reed), toma protagonismo e tenta de todas as formas ajudar sua irmã mais velha, Vera (Taylor Hickson/Anastasia Phillips), a superar possíveis choques e a sobreviver.
De início o filme nos impressiona pelas incertezas quanto aos conflitos internos e externos das personagens, mas não sabe solucionar essas questões de maneira satisfatória. A obra de Laugier funciona ao expôr o quão bárbaro e impiedoso pode ser o ser humano e suas atitudes. Seja por consequência de uma doença mental, de abusos e traumas psicológicos, ou simplesmente pelo fato de se achar superior ao outro, há quem consiga prejudicar e ferir fisicamente pessoas inocentes, além de deixar sequelas emocionais permanentes.
O problema é que isso tudo se mostra sem aquele diferencial do enredo que poderia tornar a experiência de quem assiste marcante. É tudo muito previsível e convencional, desde as tentativas de fuga até os falíveis jump scares, mal colocados por sinal.
Com a repetição de expressões exageradas de pavor e lágrimas por todo o rosto, nenhuma das atrizes cativa o suficiente. Talvez Crystal Reed seja a única que mereça maior reconhecimento, ainda que com um tempo limitado em tela. Mas um ator se destaca nesse meio: Rob Archer, interpretando o “homem gordo”. Ainda que sem muito enfoque nas suas expressões faciais, sua voz e sua linguagem corporal ao correr e se mover em quadro é assustadoramente realista, e transmite perfeitamente o pânico das personagens para o público.
Num terceiro ato que parece tentar extrair um pouco das várias tentativas de escapar muito bem apresentadas em O Homem nas Trevas (2016), o filme acaba ganhando ritmo, mas com uma falta de originalidade deplorável. Apesar de não sabermos como o filme vai se resolver, não nos envolvemos com as personagens (apesar de torcermos pela sobrevivência das mesmas) e com a história, que vira uma massa mastigada de cenas angustiantes desconjuntadas e sem profundidade dramática.
Embora tenhamos alguns clichês de roteiro aqui e outros jump scares ali, a direção de Pascal Laugier é boa e consegue criar tensão envolta da atmosfera claustrofóbica dos cômodos apertados e desconexos. Ghostland acerta ao impactar e provocar inquietação, mas falha ao emocionar. Nos sentimos como meros observadores de uma história que não vai pra frente, sem ao menos sentir empatia pela personalidade das personagens, que é totalmente ofuscada pelo único e indispensável objetivo de fugir e sobreviver.