Crítica: A Esposa

Crítica: A Esposa

Glenn Close, especialista em humanizar as “sem voz”

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Chega aos cinemas A Esposa, o mais recente projeto estrelado pela icônica atriz Glenn Close. Dirigido pelo sueco Bjorn Runge, que estreia em uma produção hollywoodiana, o filme continua a saga da famosa atriz em buscar apresentar às pessoas as vozes escondidas e massacradas das mulheres. E, o que torna isto ainda mais instigante e desafiador, é que sempre há uma figura masculina no caminho, de uma ou outra maneira.

De certa forma, é possível estabelecer uma relação clara entre o longa Albert Nobbs (2011), onde Close interpreta o personagem-título na história de um mordomo que esconde sua identidade biológica feminina por trinta anos, pelo sonho de comprar uma tabacaria e conseguir certa independência e liberdade, e A Esposa, que já deu à atriz um Globo de Ouro na categoria de drama, e que, certamente, a indicará entre as cinco para o Oscar, a ser realizado no final de fevereiro.

A obra de Bjorn Runge nos apresenta Joan Castleman (Glenn Close), casada com Joe Castleman (Jonathan Pryce), um renomado professor e escritor recém-informado que receberá o Prêmio Nobel de 1992 por sua importância no campo literário. Na viagem para Estocolmo, na Suécia, Joan vai percebendo o quanto é escanteada pela grande maioria das pessoas, incluindo Joe, e encontra em uma conversa com Nathaniel Bone (Christian Slater), biógrafo interessado em escrever a vida do homenageado, seu passado como aluna de Joe, e do rumo que sua vida tomou desde este encontro.

Existem apenas dois elementos que podem ser exaltados em A Esposa: a câmera de Runge e a performance de seu casal de protagonistas.

Tendo em suas mãos um roteiro de temas batidos, e até clichês, porém muito bem amarrados (em todas as relações de personagens), admitindo o uso da metalinguagem, e também uma boa função para símbolos como a noz que Joe costuma carregar consigo, o cineasta fez o simples e correto. Ter uma titânide como Glenn Close em seu filme dramático, como uma personagem que esconde e ao mesmo tempo deixa escapar mínimos traços de emoções, demanda uma câmera que saiba captar close-ups (ou big close-ups) de sua estrela principal, e é exatamente isso que Runge cumpre de modo cirúrgico. Como disse uma vez Patrick Stewart, também ator de grande calibre: “A câmera é como uma máquina de raio-X, qualquer ínfimo traço na face de um ator ou atriz, ela vai pegar. Nada escapa à câmera.”

Agora, falar da atuação de Glenn Close, implica citar Jonathan Pryce. O ator galês exibe aqueles tipos de performances que acabam ficando mais esquecidas, mas que são essenciais dentro da narrativa. São as atuações que se “sacrificam” para seus parceiros de tela brilharem. Alguns outros exemplos são Kristen Stewart em Acima das Nuvens; Channing Tatum em Foxcatcher – Uma História que Chocou o Mundo; e, talvez a mais conhecida do grande público, Miles Teller em Whiplash – Em Busca da Perfeição. Todos estes, assim como Pryce, insinuam grandes ações, que geram ainda maiores reações de seus co-protagonistas. Pode-se dizer que são combustível e motor ao mesmo tempo.

Mas, obviamente o maior destaque fica para a atriz mundialmente celebrada, e famosa por interpretar a vilanesca Cruella de Vil nos filmes da Disney. Close concede uma atuação de sutilezas, que faz um constante jogo de entrega e esconde. E, com a câmera de Bjorn Runge, nenhum de seus enigmáticos olhares escapam ao espectador, presenteando a quem assiste uma personagem que passa longe de ser uma vítima das circunstâncias. Nesse quesito, pode-se estabelecer um comparativo com as personagens de Isabelle Huppert e Sônia Braga em Elle e Aquarius, respectivamente.

Naturalmente, A Esposa cobre situações que retratam o cerceamento das mulheres em uma sociedade dominada por homens, e os efeitos colaterais a longo prazo desta supressão. Todavia, a obra de Runge ainda consegue demonstrar vistosa maturidade ao abordar as complexidades que envolvem um casamento, principalmente um de maior duração, e a relação de amor de duas pessoas, onde muitas vezes a racionalidade acaba por nadar em outra raia.

Além dos temas profundos, fica um exercício de maior compaixão por parte de Glenn Close, que busca retratar as dores que passam àqueles que se escondem atrás de uma cortina para realizar seus sonhos, e mostrarem seu real valor. Glenn Close, que conceito formidável!

Alexis Thunderduck