Crítica: Benzinho
Com boas reações no Festival de Sundance, drama nacional chega aos cinemas brasileiros para emocionar a todos os públicos
Ver um filho ir embora de casa nunca é fácil. Principalmente para as mães, que tendem a possuir uma relação mais próxima desde a amamentação. Porém, Benzinho é muito mais do que isso – ou pelo menos tenta ser. Karine Teles interpreta Irene, uma mulher determinada e esforçada que acaba de descobrir que seu primogênito foi convidado para jogar handebol na Alemanha. Tendo de lidar com a notícia e o medo de ver seu filho tão longe de casa, Irene ainda tenta conciliar sua vida com todos afazeres de casa, dando atenção para seus quatro filhos, ouvindo e aconselhando sua irmã (Adriana Esteves), e ainda por cima se arranjando diante das decisões inconstantes de seu marido (Otávio Müller).
O enredo funciona bem ao desenvolver o drama vivido por Irene envolta da correria e da quantidade de problemas que a personagem tenta resolver. Outro acerto é a inclusão de alívios cômicos, principalmente nas cenas entre as crianças. Mas é Karine Teles quem realmente se mostra o verdadeiro troféu de Benzinho. A atriz alcança os níveis mais desesperadores de qualquer mãe e, ao mesmo tempo, mantém a naturalidade necessária para sua personagem. Contudo, a maioria dos outros personagens não possuem tanto destaque, com exceção do filho mais velho, Fernando (Konstantinos Sarris). As notáveis interpretações dos atores compensam o pouco tempo em cena, como é o caso de César Troncoso como um cunhado explosivo, e até Mateus Solano como um técnico rancoroso que não aparece em mais de duas cenas.
O filme não é isento de complicações. Adriana Esteves, além de não impressionar, protagoniza um arco dramático que se prorroga durante o segundo ato e não agrega à história principal. Ele representa a intenção do roteiro de Gustavo Pizzi (também diretor) e Karine Teles de incrementar tristes situações vividas pelas mulheres. Embora não deixe de ser um reflexo verdadeiro e lamentável, o pequeno recorte do marido autoritário não prende a atenção do espectador – além de ser deixado de lado ao final do terceiro ato.
As fugas do roteiro não param por aí. Outra opção da direção que limitam o envolvimento do público é a longa duração de algumas cenas que pouco fazem diferença. É o caso da cena em que Irene dança ouvindo uma música que Fernando adorava, numa tentativa de chamar a atenção do filho. A cena é interessante no ponto de vista de uma mãe querendo se reaproximar de seu filho, seja por saudade ou com intenção de fazê-lo ficar, mas além de usar um espaço de tempo relativamente grande, ela é apresentada num contexto humorístico que não se encaixa com a proposta.
Se algumas subtramas e cenas agem como potenciais empecilhos frente à história principal, por outro lado temos atrativos que superam quaisquer barreiras e fazem de Benzinho mais um ótimo filme nacional. O universo criado por Gustavo Pizzi se torna algo único e crível. Os sons dos carros e ruídos por todos os lados denota o realismo urbano e conturbado das cidades, mas ao mesmo tempo a paleta de cores suaves dão uma identidade sutil e inocente aos personagens. Alguns elementos do roteiro também chamam a atenção, como o frequente uso de diálogos rápidos e simultâneos entre Irene, seus filhos e seu marido. Isso é um dos belíssimos exemplos que nos mostra o quanto a vida consegue ser desorganizada, corriqueira e complicada para uma mãe.
Não é difícil sair da sessão enxugando as lágrimas após presenciar um retrato tão fiel da maternidade contemporânea, juntamente com o conflito pessoal da personagem principal em deixar o filho ir paro mundo sozinho. Os sentimentos de saudade, medo, e todas as dúvidas que surgem são inexplicáveis. Por isso mesmo o roteiro nem faz questão em explicar. Ele apenas aponta os sentimentos de Irene através de suas ações, expressões e gaguejos.
Parte destes sentimentos também podem ser captados pela simples forma que um ambiente se encontra iluminado. A iluminação aqui faz um grande trabalho ao mesclar luzes quentes e alaranjadas com tons frios e azulados. Este contraste cogita uma possível ambiguidade nas intenções de Irene, que, ao mesmo tempo em que busca rever seus conceitos e entregar seu filho para o mundo, também retém o clássico sentimento de tê-lo consigo para o resto de sua vida.
Apesar de uma dificuldade em filtrar o que move a história do que a embaraça, Benzinho traz uma visão necessária e reflexiva sobre a vida e as relações que possuímos com a nossa família. De maneira delicada, a obra é um ensaio sobre o que fazemos por nossos filhos e para eles, e o espaço que precisamos dar para que os mesmos possam seguir com suas vidas, se espelhando em nossas ações ou não.