Crítica: Dunkirk

Crítica: Dunkirk

Cinéfilos de todo o mundo consideram impossível a tarefa de NÃO ficar ansioso quando Christopher Nolan, um dos cineastas mais prestigiados da atualidade, anuncia um novo lançamento. Sim, confesso que também falhei em manter-me calmo, pois minhas altas expectativas falaram mais alto desde que o primeiro trailer foi divulgado. Concordo, esse início de crítica pode ter dado a impressão que essas expectativas atrapalharam minha experiência e portanto não gostei tanto quanto esperava. Porém, o mais espantoso é que há momentos em que as altas expectativas são inevitáveis, e mesmo assim elas não atrapalham o trajeto de suas emoções e sua imersão na história.

Assistir Dunkirk é exatamente isso. Independente do que você aguarda, vai se impressionar com o primoroso conteúdo do filme. Nolan acerta mais uma vez e, dessa vez, com uma produção bem diferente do que costuma se arriscar.

Apostando em um drama de guerra baseado em fatos reais, o diretor (e roteirista) conseguiu transmitir todas as terríveis sensações de seus personagens, e embora nenhum deles seja aprofundado, todos representam a capacidade que uma guerra tem de destruir e influenciar diversas vidas. E, talvez nessa falta de um único protagonista, é onde nos identificamos tanto com a obra. Mas o “batismo” do filme vai muito além dos elementos de roteiro, pois em cada princípio técnico a produção aparenta contar um pouco mais sobre a história e deixar-nos arrepiados através dos ingredientes audiovisuais.

A sinopse parte da Operação Dínamo, mais conhecida como a Evacuação de Dunquerque, onde soldados aliados da Bélgica, do Império Britânico e da França são rodeados pelo exército alemão e devem ser evacuados durante uma feroz batalha no início da Segunda Guerra Mundial. Nisso, somos apresentados a vários personagens que se dividem em ambientes aéreos, onde pilotos britânicos da força aérea como Collins (Jack Lowden) e Farrier (Tom Hardy) lutam pelas vidas de inúmeros soldados aliados em terra; e marítimos, local onde se passa o maior tempo do filme, introduzindo navios ingleses que tentam abrigar seus numerosos homens. Entre os soldados se destacam Tommy (Fionn Whitehead), Alex (Harry Styles) e Gibson (Aneurin Barnard).

Outro grupo de pessoas que se faz presente no mar são os valentes Sr. Dawson (Mark Rylance), seu filho Peter (Tom Glynn-Carney), e George (Barry Keoghan), que tentam resgatar soldados com seu humilde barco de pesca e sua vontade de ajudar o país. Em pouco tempo, um soldado anônimo e traumatizado pela guerra interpretado por Cillian Murphy logo se junta aos três. Não me esqueceria de importantes personagens como o Comandante Bolton (Kenneth Branagh) e o Coronel Winnant (James D’Arcy), responsáveis pela evacuação dos soldados e sempre presentes no píer ajudando a organizar as tropas que vão para os navios.

Dunkirk abre logo com cenas chocantes, mais uma vez intensificadas pela incrível edição e mixagem de som dos filmes de Nolan – que, como de costume, se mostram indispensáveis e torna obrigatória a experiência frente à um bom cinema em IMAX. Não somente os efeitos sonoros nos ajudam a penetrar a história e os sentimentos dos personagens, como também a própria direção de Nolan e a sublime escolha de planos de Hoyte van Hoytema, diretor de fotografia que responsável por obras magníficas como Ela (2013) e Interestelar (2014). Os enquadramentos constroem sensações como claustrofobia e apreensão de forma jamais vista no cinema, forçando o expectador a se imaginar no lugar dos personagens. Apesar de não ser oficialmente um “protagonista”, Tommy é o personagem que mais o público se projeta, sente afeto e se preocupa, o que cria uma forte dependência da esperança e do medo construída pelo roteiro.

A trilha musical do mestre Hans Zimmer (eterno colaborador do diretor) dessa vez não chega a ser tão inspiradora e cativante como em Inception (2010) ou em Interestelar (2014), mas cumpre sua função de guiar nossas emoções. Quem realmente rouba a atenção é Lee Smith, que com uma montagem fabulosa, intercala os planos de Hoytema incrivelmente, com cortes precisos. Porém, o que orienta significativamente a nova produção de Nolan e sua esposa Emma Thomas (que envolveu nada menos que 150 milhões de dólares) é a paleta de cores escuras e frias que enfatiza uma atmosfera densa, pessimista.

O filme tem sim muitos tiros, bombas e explosões (como qualquer filme de guerra), mas é impressionante o tratamento da obra perante esses efeitos visuais, não os deixando roubar as atenções e provar-se como um filme somente de ação. Na verdade, Dunkirk é um drama acima de tudo, pois o enfoque está todo na relação entre os soldados e na humanidade contida nos pequenos atos. Um ensinamento aqui, outra delicadeza ali: é assim que o filme vai se moldando e emocionando seu expectador como nenhum outro filme de guerra já fez. A celebração pela vida, o medo de morrer, o calafrio na espinha, tudo isso influencia nossa sensibilidade, nos faz amar nosso semelhante e nos preocupar com a vida alheia; ou ao menos deveria. Mais uma grandiosa produção que vale a pena.

FICHA TÉCNICA
Direção e Roteiro: Christopher Nolan
Elenco: Fionn Whitehead, Tom Glynn-Carney, Mark Rylance, Jack Lowden, Tom Hardy, Cillian Murphy, Harry Styles, Barry Keoghan, James D’Arcy, Aneurin Barnard, Kenneth Branagh
Produção: Emma Thomas, Christopher Nolan
Fotografia: Hoyte van Hoytema
Montagem: Lee Smith
Música: Hans Zimmer
Gênero:
Drama / Ação
Duração: 110 min.

João Pedro Accinelli

Amante do cinema desde a infância, encontrou sua paixão pelo horror durante a adolescência e até hoje se considera um aventureiro dos subgêneros. Formado em Cinema e Audiovisual, é idealizador do CurtaBR e co-fundador da 2Copos Produções. Redator do Cinematecando desde 2016, e do RdM desde 2019.