Crítica: Herança de Sangue

Crítica: Herança de Sangue

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O guerreiro da estrada voltou. Mas não como esperávamos. Em Herança de Sangue, thriller que encerrou o último Festival de Cannes, vemos o problemático astro Mel Gibson em sua melhor atuação dos anos recentes. Dirigido pelo francês Jean-François Richet (Inimigo Público No. 1 Partes 1 e 2 e o competente remake de Assalto à 13a Delegacia), o longa acerta ao remover o foco da ação e apontá-lo na direção de seus personagens. Faltou, porém, uma história melhor para sustentá-los durante seus breves 90 minutos de duração.

Herança de Sangue, baseado em livro homônimo de Peter Craig, conta a história de Lydia Carlson (a ótima Erin Moriarty, Capitão Fantástico), tida como desaparecida pelas autoridades, que na realidade fugiu com seu namorado fora-da-lei (Diego Luna, Rogue One) para ajudá-lo a manter seus esconderijos de droga na região campestre do sul dos Estados Unidos. Quando confrontada com ações ainda mais desafiadoras, um acidente ocorre e Lydia se vê forçada a fugir novamente. É aí que recorre ao seu pai biológico, John Link (Riggs… quer dizer, Gibson), alcóolatra em recuperação que possui um estúdio de tatuagem em seu trailer, para sobreviver à onda de violência que virá.

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Logo de cara, já ficamos fascinados pela onipotente presença de Gibson em tela, muito mais contido e natural desta vez. Em um papel que parece refletir muitas de suas já conhecidas falhas, Gibson incorpora sua própria personalidade ao personagem, o que funciona maravilhosamente. Isso funciona ainda mais quando divide cenas com Moriarty, inteligentemente tocando nas diferenças geracionais dos dois indivíduos.

Há, por exemplo, uma ótima cena na qual Link e sua filha pegam carona em um caminhão cheio de agricultores mexicanos. Enquanto o pai preconceituoso e bruto insiste no infundado argumento de que tais trabalhadores roubam seu emprego (pensamento reforçado por conservadores como Donald Trump, entre muitos outros), a filha subversiva rebate seu raciocínio de maneira deliciosamente irônica: “Ah é? Você colhia laranjas? Acho que nenhum homem branco já colheu alguma laranja em sua vida”.

Esse tipo de química falha entre os dois é o ponto alto do longa, que felizmente consegue gerar bastante empatia pelos dois personagens a ponto de torná-los, de certa maneira, memoráveis. Há outras cenas que trazem uma intimidade e uma doçura, como a cena em que Link e seu amigo conversam por telefone, apesar de estarem um de frente para o outro a duas dezenas de metros de distância. Ou seja, kudos para o diretor Richet por confiar na força de pequenos momentos, diferente de muitos autores de ação.

E por falar em ação, há claramente momentos dela no longa, apesar de que nenhuma sequência chegue a superar o momento do ataque ao parque de trailers, logo no primeiro ato. Trata-se de um thriller que aposta mais na tensão de ser perseguido que culmina ocasionalmente na adrenalina de tiroteios. Ao longo de seus primeiros dois atos, essa tensão funciona e é muito bem equilibrada com o senso de humor dos personagens.

Infelizmente, em seu ato final, a trama depende demasiadamente de clichês ultra-batidos e quebra o clima quase que completamente, além de dar pouco espaço para seus protagonistas brilharem. É uma conclusão corrida e preguiçosa que só chega a machucar o longa ainda mais, justamente pela força comparativamente imensa do que veio antes.

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No entanto, é ótimo ver que uma estrela como Mel Gibson ainda tem algo a mostrar, mesmo depois de tantos baixos em sua carreira. Melhor ainda, é ver uma figura assim confrontar seus próprios demônios, mesmo que em um longa médio de ação… Talvez Jodie Foster ainda possa fazer mais longas com o amigo?

Trailer

Caio Lopes

Formado em Rádio, TV e Internet pela Faculdade Cásper Líbero (FCL). É redator no Cinematecando desde 2016.