Crítica: O Juízo

Crítica: O Juízo

Ganância e desigualdade

O Juízo

O tema do poder do dinheiro já nos é extremamente familiar no cinema mundial, incluindo obras nacionais que anteriomente se dispuseram a criticar o egoísmo humano em suas piores formas. Num cenário onde evidencia-se a desigualdade social e denuncia-se os males de um longo e traumático período de nosso país, a escravidão, surge O Juízo. Dissertando e oferecendo visões sobre ganância, enquanto pincela um contexto de espiritualidade e hereditariedade, a obra traça um caminho de poucas qualidades, e de muitas falhas comprometedoras.

Após se mudar para a antiga casa de seu avô, a qual acabara de herdar, o alcoólatra Augusto (Felipe Camargo), sua esposa Tereza (Carol Castro) e seu filho Marinho (Joaquim Torres Waddington), não esperavam que a propriedade carregasse uma maldição e espíritos de escravos determinados a se vingar dos antepassados de Augusto. Conforme as ameaças se instalam lentamente, os personagens emergem em uma crise emocional gradativa, enquanto tentam encontrar uma forma de sobreviver.

Não há elementos narrativos suficientes em O Juízo para que a obra se sustente ao longo de seus 90 minutos, que por sinal, aparentam durar mais do que realmente isso. Do roteiro de Fernanda Torres à direção de seu marido Andrucha Waddington, há uma inconsistência de ritmo que, embora em certas sequências nos mantenha curiosos a respeito daquele mistério, na maioria das vezes nos coloca diante de situações cansativas e pouco relevantes para a trama, como que em uma tentativa de estender o suspense mais do que deveria. Ansiamos por pontos de viradas memoráveis que jamais chegam, uma vez que a obra prolonga o drama de seus personagens demasiadamente.

Se a música, a fotografia e a direção de arte criam uma atmosfera interessante, logo esta é facilmente desperdiçada pela falta de originalidade do filme, que mesmo diante de esforços para juntar elementos de horror e drama, retratando hipocrisias e questões sociais, não se distancia muito das inúmeras obras sobre ganância, egoísmo e conflitos familiares que já conhecemos.

De uma forma geral, o diverso elenco do filme não encontra grandes problemas em seus papéis. Carol Castro entrega uma atuação convincente e impressiona em certos momentos. Já Felipe Camargo e Joaquim Torres apenas cumprem com o esperado. Mas as participações de Lima Duarte, Criolo e principalmente Fernanda Montenegro, são alguns dos pontos mais positivos da obra. Os atores dão um show com personagens marcantes, mas são incapazes de ocultar as graves imperfeições do filme.

Como a própria roteirista disse em coletiva de imprensa, o suspense é um gênero e um tipo de filme que se trabalha diálogos e circunstâncias que beiram o risível, principalmente em um país onde seu próprio público está acostumado a satirizar e desvalorizar seus próprios costumes. Isso sem dúvidas será outro grande empecilho para que o filme encontre uma audiência e seja reconhecido. Mas é na falta de objetividade, dinamismo e criatividade que o longa encontra seu maior inimigo. Mesmo que com algumas boas cenas, O Juízo não consegue sair da superficialidade de seus temas, ainda que se mostre disposto a isso.

João Pedro Accinelli

Amante do cinema desde a infância, encontrou sua paixão pelo horror durante a adolescência e até hoje se considera um aventureiro dos subgêneros. Formado em Cinema e Audiovisual, é idealizador do CurtaBR e co-fundador da 2Copos Produções. Redator do Cinematecando desde 2016, e do RdM desde 2019.