Crítica: O Primeiro Homem
Entre a Terra e a Lua
Nada define a fama de Neil Armstrong tão bem quanto o epíteto “o primeiro homem a pisar na Lua”. Mas a verdade é que sua vida pessoal fora cheia de complicações familiares e cotidianas, principalmente durante o período de sua missão para a Lua. É exatamente a partir do desafio de contar sobre a vida de Armstrong e equilibrá-la com os detalhes operacionais da NASA durante a década de 60 que o diretor Damien Chazelle e o roteirista John Singer (responsável pelo roteiro de cinebiografias jornalísticas como Spotlight e The Post – A Guerra Secreta) decidem embarcar numa aventura imersiva ao adaptar para as telas o livro de James R. Hansen, O Primeiro Homem: A Vida de Neil Armstrong.
Após perder uma filha, Neil (Ryan Gosling) e sua esposa Janet (Claire Foy) tentam lidar com as necessidades de seus outros filhos e com seus próprios psicológicos. Para piorar, os encargos e responsabilidades profissionais de Neil como piloto de teste se tornam cada vez maiores e mais frequentes. Conforme ele e seus companheiros passam a notar e presenciar falhas fatais nos testes e nos equipamentos da NASA, cresce a preocupação com as consequências que a obsessão pela ambiciosa viagem à Lua podem causar.
Enquanto Ryan Gosling incorpora a frieza e concentração de Neil Armstrong, Claire Foy traz coragem e determinação para Janet Shearon, esposa do astronauta. Se tratando de um drama biográfico, como de costume não há muito espaço para os atores coadjuvantes e seus personagens secundários, mas todos estão bem em seus papéis e ajudam a história a fluir.
O tempo que o filme entrega para a vida pessoal e profissional de Neil é tão igualmente balanceado. Assim, quando estamos envolvidos no drama e na convivência familiar de Neil, o filme nos joga para a atividade espacial, ao passo que quando estamos começando a nos interessar pelos astronautas e pelas pesquisas da NASA, somos apresentados novamente à família.
Difícil afirmar se isso foi uma tentativa intencional da direção ou mesmo do enredo em refletir no espectador o quão atribulado foi esse período da vida de Neil, mas talvez teria sido mais interessante um enfoque específico na profundidade das relações familiares e pessoais do protagonista, ou mesmo nas suas atribuições profissionais.
Devemos perceber que mesmo que muitas vezes nos deparemos com personagens impenetráveis, com emoções quase inacessíveis (visto as interpretações para “dentro” dos atores), que por vezes impedem uma aproximação significativa do público, O Primeiro Homem emociona pelo contexto dramático de perdas de pessoas próximas e riscos corridos em prol de uma missão perigosa.
Boa parte dessa emoção origina de uma eficaz conciliação entre a câmera tremida, os carregados efeitos sonoros e os rápidos cortes, que dão uma enorme imersão à missão e aos testes realizados no espaço, mas não impedem que a emotiva trilha musical de Justin Hurwitz resplandeça sobre nós, trazendo a tona em forma de desabafo todas angústias do protagonista, e ao mesmo tempo manifeste a esperança depositada por Neil, seus companheiros e sua família.
Mais dramático e menos ritmico do que Whiplash. Menos deslumbrante porém mais realista do que La La Land. É assim que o terceiro longa de Chazelle se enquadra dentro de sua filmografia. Mas a verdade é que, felizmente, sua parceria com seus colaboradores (que vão muito além de Ryan Gosling) Tom Cross (como montador), Linus Sandgren (como diretor de fotografia) e principalmente Justin Hurwitz (como compositor musical), continua “cantando estações” e encantando públicos.