Crítica: Personal Shopper

Crítica: Personal Shopper

Kristen Stewart é, sim, uma boa atriz. Quando despontou aos olhos de um maior público com a Saga Crepúsculo, na era em que redes como 9GAG marcavam presença, ficou conhecida popularmente como o contrário, estoica ao encarnar a protagonista Bella. Mas há muito de bom a ser dito sobre a jovem atriz, que já havia demonstrado seu talento no ótimo Quarto do Pânico, suspense de David Fincher (Mindhunter) no qual interpretou a filha de Jodie Foster. Até mesmo depois de seu infame papel na saga dos vampiros brilhosos, Stewart realizou trabalhos expressivos, com destaque para sua interpretação premiada em Acima das Nuvens, do diretor francês Olivier Assayas.

Repetindo a parceria com Assayas em seu novo longa Personal Shopper, Kristen Stewart parece encontrar terra firme em produções menores e mais pessoais. Enquanto a atriz dividia seu tempo de tela com a sublime Juliette Binoche em Nuvens, aqui a jovem se compromete a carregar um roteiro inteiro nas costas, o que é de se admirar dado o fato de que sua personagem passa longa parte do enredo sozinha.

Stewart interpreta Maureen, jovem que trabalha como personal shopper para uma importante figura do mundo da moda. O que é uma personal shopper? É alguém encarregado de realizar tarefas que pessoas já muito famosas não são capazes de fazer sem serem notadas ou importunadas. Apesar de se tratar do título do filme, o foco aqui é a relação de Maureen com seu irmão morto, o qual prometeu enviar um sinal do além, tendo sido um médium em vida assim como sua irmã. A obsessão de Maureen com o ente perdido logo dá lugar a situações crescentemente tensas, fazendo-a duvidar de sua sanidade e de tudo que a cerca.

Segundo muitos críticos e cinéfilos, Personal Shopper é definido como um filme de fantasma, o que é uma verdade. Contudo, como um longa de Olivier Assayas, a natureza de seu enredo é muito mais críptica e inconclusiva do que a grande maioria dos exemplares recentes de gênero. Tal natureza pode frustrar os espectadores que buscam soluções concretas ou até mesmo grandes sustos, apesar da inegável tensão de momentos como o qual Maureen recebe mensagens constantes de um desconhecido ou até mesmo seu inesperado encontro com uma aparição, visualmente interessante apesar do fraco trabalho de CGI.

Mesmo com seu trabalho vaiado em Cannes ano passado, Olivier Assayas levou o prêmio de Melhor Direção no festival, em uma decisão polêmica mas completamente justificada do júri. O francês, que também assinou o roteiro, toma riscos diversos e aposta no hibridismo entre estudo de personagem e terror psicológico, algo que poderia resultar em constrangimento caso nas mãos de um realizador menos astuto. Há uma série de situações que são resolvidas de forma refrescantemente simples e não menos impactantes por isso.

E se Assayas falava de musas em seu Acima das Nuvens, com certeza encontrou sua nova em Kristen Stewart, que aparenta ainda mais focada aqui, demonstrando um interesse curioso em narrativas cada vez menos convencionais. A atriz marca presença em suas cenas com outros intérpretes, mas são seus momentos de solidão e silêncio que evidenciam o comprometimento com o material. Os momentos nos quais Maureen dialoga por mensagens de texto com uma presença desconhecida e aparentemente onipresente são especialmente marcantes, imprimindo um misto de medo e curiosidade. Ora, até mesmo tentação (pelo que é proibido).

Personal Shopper nem sempre acerta o pouso, mas pelo menos voa alto por grande parte do tempo, sem medo de arriscar e ser ridicularizado. O mesmo pode ser dito tanto sobre seu diretor e sua estrela, admiráveis em sua fuga do conformismo cinematográfico ao qual muitos se entregam. Pois bem, acreditem: não há vaia que dilua a coragem transgressora de Assayas e Stewart.


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Caio Lopes

Formado em Rádio, TV e Internet pela Faculdade Cásper Líbero (FCL). É redator no Cinematecando desde 2016.

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