Crítica: Se a Rua Beale Falasse

Crítica: Se a Rua Beale Falasse

Barry Jenkins e seu talento em sensibilizar a realidade

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Ser negro e viver em uma sociedade preconceituosa é lidar com: maiores dificuldades de se conseguir um emprego; a intolerância que vem de agressões físicas, verbais ou mesmo olhares tortos; e até mesmo arcar com acusações (e condenações) de crimes que você não cometeu, apenas por possuir uma cor de pele mais escura e fazer parte de uma estatística que se mantém por falta de oportunidades e por conta do descaso de forças policiais e governamentais.

Em Se a Rua Beale Falasse, Barry Jenkins, diretor do premiado Moonlight (2017), assina a direção e o roteiro de uma sensível história adaptada do livro homônimo de James Baldwin. No filme, nos identificamos com o romance inspirador de Fonny Hunt (Stephan James) e Tish Rivers (KiKi Layne), um casal apaixonado ansioso para ter uma casa e viver junto. Porém, tudo desanda quando Fonny é acusado de um crime que não cometeu, ao mesmo tempo que Tish descobre estar grávida.

Enquanto Tish, sua mãe e sua irmã vão em busca de um advogado e de provas que possam inocentar Fonny e tirá-lo da cadeia antes que seu filho nasça, somos levados, por meio de flashbacks, pelo romance que o casal construiu aos poucos. Jenkins equilibra perfeitamente o conturbado presente de um casal que se ama com as lembranças aconchegantes do começo do relacionamento, com uma sensibilidade que só o diretor sabe criar.

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As cenas de amor entre Fonny e Tish são de tirar o fôlego. Ao mesmo tempo que, por conta da emocionante trilha sonora de Nicholas Britell (junto a uma ótima soundtrack de músicas de disco e jazz), tudo pareça idealizado em um ambiente onírico, a fotografia de James Laxton traz um realismo pé no chão com uma bela iluminação e enquadramentos que nos lembram mais retratos pintados do que simples cenas filmadas por uma câmera.

O roteiro traz veracidade em diálogos poderosos que expõem os pensamentos mais profundos dos personagens, enquanto suas ações refletem perfeitamente seus sentimentos frente a um mar de injustiças e situações revoltantes. E se os personagens são tão identificáveis e realisticamente construídos em cima de qualidades e defeitos, boa parte disso se deve às ótimas interpretações de KiKi Layne, Stephan James e principalmente, Regina King, que interpreta a mãe de Tish, uma mulher forte, corajosa e honesta.

Ainda que o filme nos deixe vontade de ter tido um contato maior com os fatos do crime, sabemos desde o início que esse não é e nem deveria ser o foco do filme. Se a Rua Beale Falasse é a imagem que representa milhões de casos existentes num mundo onde as suposições e o preconceito se sobressaem ao que é justo e verdadeiro. De uma maneira emocionante, Barry Jenkins traz uma interessante combinação de drama e romance, que deve promover pensamentos a respeito de nosso papel na sociedade, para que juntos possamos buscar um futuro menos desigual, mais justo e sem intolerância.

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João Pedro Accinelli

Amante do cinema desde a infância, encontrou sua paixão pelo horror durante a adolescência e até hoje se considera um aventureiro dos subgêneros. Formado em Cinema e Audiovisual, é idealizador do CurtaBR e co-fundador da 2Copos Produções. Redator do Cinematecando desde 2016, e do RdM desde 2019.