Crítica: Sicario – Dia do Soldado

Crítica: Sicario – Dia do Soldado

Sequência de Sicario – Terra de Ninguém traz mais violência e menos reflexão

Imagem do filme Sicario - Dia do Soldado

Sicario – Terra de Ninguém, dirigido por Denis Villeneuve, foi uma das grandes surpresas cinematográficas do ano de 2015. Claro, sua equipe era formada por diversos profissionais de renome, mas foi o conjunto destas partes o responsável por elevar um roteiro mais costumeiro de Taylor Sheridan a algo bem mais assombroso, abalando o espectador pela base e impregnando sua mente ao não fornecer respostas fáceis.

Com muitas dessas partes fora do jogo, como Villeneuve, a atriz Emily Blunt, o diretor de fotografia Roger Deakins e o falecido compositor Jóhann Jóhannsson, Sicario – Dia do Soldado surge em meio a expectativas moderadas, com as maiores esperanças recaindo sobre o roteiro novamente assinado por Sheridan, que cresceu exponencialmente nos últimos anos, e o retorno dos atores Benicio Del Toro e Josh Brolin a seus fascinantes papéis. Enquanto isso, a direção fica por conta do italiano Stefano Sollima (Suburra), a fotografia sob os cuidados do ótimo Dariusz Wolski (Alien: Covenant) e a trilha musical, por fim, é assumida por Hildur Guðnadóttir (Maria Madalena), protegida de Jóhannsson. O novo conjunto é eficiente, mas será suficiente para elevar a experiência?

Dependendo do apreço do espectador com o filme de 2015, Sicario – Dia do Soldado não ressoa e nem impacta como o capítulo anterior. Isso não quer dizer que Dia do Soldado não tenha uma quantidade considerável de momentos “pé-na-porta” – os tiroteios são ruidosos como o que já era esperado, e seus personagens ainda tomam decisões moralmente cinzentas em meio à dança das cadeiras do narcotráfico. O problema principal está na estrutura adotada pelo roteiro de Sheridan, que desta vez divide a narrativa em uma variedade de subtramas, das quais algumas acabam se perdendo ou são bruscamente interrompidas ao longo das duas horas de duração. Pensem em Traffic sob o efeito de esteroides.

A trama resgata os brucutus Matt Graver (Brolin) e Alejandro Gillick (Del Toro), agora numa nova missão de criar uma guerra entre os cartéis. Após ataques terroristas em solo americano (um elemento que o roteiro parece incluir inconsequentemente e exclusivamente pelo choque), Graver encontra uma conexão entre os atentados e os cartéis, recrutando Gillick para o sequestro da filha de um grande narcotraficante – no caso, o manda-chuva por trás do assassinato de sua família – com fins de desestabilizar as operações ilegais que trouxeram os terroristas aos EUA em primeiro lugar. Sem um ponto de vista uniforme, a trama de Dia do Soldado se torna mais difusa do que deveria, e algumas revelações quase passam despercebidas em meio à ação. Aqui, a máquina do tráfico é retratada de maneira apropriadamente complexa, porém essa complexidade dilui parte do elemento que tornou o original de Villeneuve tão marcante: a ambiguidade de ver essa “fera” pelo lado de fora, de um ponto de vista mais regrado.

No entanto, sem o primeiro capítulo fresco na memória, Sicario – Dia do Soldado pode funcionar muito bem como um thriller policial enérgico e até mesmo imprevisível, contando com sequências de ação bem executadas e momentos de tensão que culminam em acontecimentos realmente chocantes. Ainda mais inesperados são os (poucos) momentos de ternura entre Gillick e a personagem interpretada (e muito bem) por Isabela Moner (Transformers – O Último Cavaleiro), que soam incoerentes com a brutalidade vista no filme anterior mas são inegavelmente eficientes em sua construção. Sente-se a certa altura que Dia do Soldado cogita fazer um soft reboot, ou seja, criar um recomeço para seus personagens através de rasuras sobre suas ações mais questionáveis, preparando o terreno para que o público dos filmes de ação tenha uma preocupação mais concreta com os destinos de Graves e Gillick a caminho de um já planejado terceiro longa.

Se Sicario – Terra de Ninguém funcionou como uma espécie de Cassino Royale, trazendo uma cadência distinta e um certo peso a um gênero muitas vezes ditado pela testosterona, Dia do Soldado é seu Quantum of Solace, mais ajustado às sensibilidades do cinema de ação moderno, embora executado com competência. Caso vá ao cinema esperando por brutalidade e algumas boas guinadas, Sicario – Dia do Soldado deve satisfazer em um nível visceral, deixando ainda um gancho curioso para o próximo capítulo. Mas caso procure uma experiência mais reflexiva e rica em sua atmosfera, como a que Villeneuve propôs há três anos, a decepção é bastante provável.

Caio Lopes

Formado em Rádio, TV e Internet pela Faculdade Cásper Líbero (FCL). É redator no Cinematecando desde 2016.