Crítica: Três Anúncios para um Crime
Este filme fez parte da programação oficial da 41º Mostra Internacional de Cinema em São Paulo.
A estreia oficial está marcada para 15/02/18, com distribuição da Fox.
Começarei essa crítica com uma pergunta: Por que Frances McDormand demorou tanto tempo para voltar às telonas com uma personagem de peso? Desde Fargo (o filme já tem 20 anos!) eu não a via em um papel tão marcante e poderoso. Enquanto a admirava em Três Anúncios para um Crime, cheguei à conclusão de que eu estava com saudade de vê-la atuando; e o mais engraçado é que só me toquei disso assim que o filme começou. Está certo que, mesmo como coadjuvante ou fazendo participações especiais, Frances sempre brilha. Quase Famosos, Queime Depois de Ler, Moonrise Kingdom e Ave, César! são bons exemplos, mas você não está preparado(a) para ver o que a atriz – vencedora da Tríplice Coroa de Atuação – entregou no novo longa de Martin McDonagh. Uma atuação dessa magnitude vem para mostrar que, de vez em quando, é possível nos depararmos com uma obra que mexa com inúmeros sentimentos e nos deixe refletindo, analisand não somente sobre o que nos foi apresentado como também sobre a vida que nos cerca.
Gosto de pensar que Três Anúncios sobre um Crime é um grande filme com subtextos que, na verdade, não estão implícitos, mas escancarados a cada cena. A contemporaneidade presente no filme de McDonagh é maior do que sua premissa, que fala sobre Mildred Hayes (McDormand), mulher que aluga três outdoors para deixar uma mensagem à polícia da pequena cidade de Ebbing, no Missouri: sua filha foi estuprada e assassinada, já se passaram sete meses e a polícia não tem pistas de quem cometeu o crime. O que poderia ser um filme essencialmente de investigação e drama acaba se tornando um verdadeiro percurso que vai da raiva à piedade, do desespero à intolerância, do sarcasmo à tristeza. Este é um filme difícil e sobretudo real, legítimo às injustiças que tanto vemos a cada dia que passa.
Contudo, o que mais se destaca em Três Anúncios é o modo como o diretor se sente confortável ao abordar tão bem as nuances de seus personagens, mostrando que a raiva pode ser o combustível para muitas coisas, assim como a empatia. Ao passear pela montanha-russa de sentimentos na vida de Mildred e também nas experiências de Dixon (Sam Rockwell) e Willoughby (Woody Harrelson), dois policiais locais, é fantástico ver o tom violento mesclar com o irônico – o que até pode fazer alguns cinéfilos pensarem que estão assistindo a um filme dos irmãos Coen. Há vezes em que, em uma única cena, vemos esses tons se misturarem de uma forma tão repentina que é impossível não sentir o impacto. Em uma das melhores cenas – uma discussão acalorada entre Mildred e Willoughby –, é inevitável pensar que a briga causará algo bem mais sério; mas então, um segundo depois, estamos presenciando um momento de estima. Empatia. E quando um diretor (junto com a excelência dos atores) consegue fazer isso em uma única cena… é simplesmente algo que não sairá da sua cabeça tão cedo.
O impacto que Três Anúncios carrega perderia facilmente a força caso o elenco não fosse composto por McDormand, Rockwell e Harrelson, que esbanjam brilhantismo e naturalidade. Os três surpreendem muito; sobretudo Rockwell, que entrega um personagem que progride e retrocede ao mesmo tempo. E o roteiro, sempre ‘brincando’ com as reviravoltas ao longo de duas horas de filme, também auxilia no tratamento dos três personagens e os torna extremamente verossímeis, com o intuito de simplesmente mostrar como os americanos pensam. Pode até parecer absurdo em alguns momentos, mas tudo que nos é mostrado é a verdade nua e crua… especialmente se pensarmos que o personagem de Rockwell, por exemplo, é nada mais nada menos que o típico eleitor de Trump.
Preconceito, raiva, desigualdade, ignorância, intolerância.
Piadas, ironia, empatia, identificação, perdão.
Complexo em seu conteúdo mas simples na forma que o explica, Três Anúncios para um Crime transita entre essas palavras para, no fim, misturar tudo e tornar-se algo maior. Um filme como esse raramente aparece e dificilmente deixará os espectadores indiferentes. Basta analisá-lo como um retrato do nosso tempo para entender sua mensagem e, por consequência, se sensibilizar.
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