Crítica: As Golpistas

Crítica: As Golpistas

Dias de glória, dias de luta

As Golpistas

Logo no início de As Golpistas, numa cena que ressignifica para sempre o hit do rock alternativo Criminal, da cantora Fiona Apple, Jennifer Lopez (ou melhor, Ramona, sua personagem) faz uma exuberante performance de pole dance. Enquanto os homens babam ao seu redor, arremessando notas de um dólar no palco do clube de striptease, Destiny (Constance Wu) olha aquilo com um sentimento de devoção verdadeiro. É como se, pela primeira vez na vida, encontrasse alguém que a inspire.

Na sequência seguinte, Ramona coloca Destiny sob sua asa, no caso um casaco de pele que dividem para espantar o frio do inverno nova-iorquino. Está formado o elo entre as duas mulheres, a relação mestra/pupila que molda o filme escrito e dirigido por Lorene Scafaria, inspirado em reportagem publicada pela jornalista Jessica Pressler.

O texto jornalístico, veiculado em dezembro de 2015 na revista New York, narrava o caso de um grupo de strippers que, abandonadas pelos clientes vindos direto de Wall Street após a crise financeira de 2008, armou uma série de truques para dar o troco no tipo de homem que sempre as exploraram. O longa, porém, apenas parte deste encontro com a repórter (vivida por Julia Stiles), para aprofundar a trajetória daquelas profissionais, normalmente ainda estereotipadas no imaginário coletivo como cidadãs de segunda classe. Como Destiny diz na fala que abre o roteiro, essa é uma história sobre tomar controle da própria narrativa.

Em sua estética, As Golpistas joga muito bem com a dualidade entre a euforia do ambiente de luzes escuras e música alta da boate, da camaradagem entre as dançarinas, e a melancolia de suas vidas solitárias da porta para fora. Sem pesar a mão no drama, o filme consegue encontrar humor até nos momentos mais tensos, como quando o time precisa levar ao hospital um cliente desmaiado e peladão.

Lorene Scafaria ainda deixa no ar uma questão: no mundo do capitalismo selvagem, cada um usa as armas que tem para tentar faturar seu troco. Quem vai dizer que especular na bolsa de valores é menos grave do que os golpes que as garotas aplicaram? Como diz Ramona, “o mundo é um grande clube de striptease. Há os que jogam dinheiro, e os que dançam”. Difícil pensar numa metáfora mais acertada.

Diego Olivares

Crítico de cinema, roteirista e diretor. Pós-graduado em Jornalismo Cultural. Além do Cinematecando, é colunista do Yahoo! Brasil