Crítica: Cry Macho – O Caminho para a Redenção

Crítica: Cry Macho – O Caminho para a Redenção

Não há como ficar indiferente ao título deste filme. Além do peso simbólico que Clint Eastwood carrega consigo, Cry Macho representa um projeto de paixão do realizador, tendo adquirido os direitos de adaptação do livro homônimo de N. Richard Nash. Depois de décadas como a figura do forasteiro imponente, do cowboy destemido, o título agora sugere um tom de desconstrução de tais figuras, criando tremenda curiosidade com o projeto, e é isso que ocorre aqui até certo ponto. Contudo, o subtítulo O Caminho Para a Redenção parece não só genérico como equivocado.

Mike Milo (Eastwood) é um cuidador de cavalos e anteriormente uma estrela dos rodeios no Texas, até que um acidente o tirou do jogo. No ostracismo, Milo recebe de seu antigo chefe uma tarefa possivelmente desafiadora: trazer seu filho, que está no México, para a fronteira. O protagonista aceita o trabalho e logo se vê em terras estrangeiras, à procura do garoto. Assim começa uma história de descoberta, não de redenção, tanto para Milo quanto para o rapaz, Rafael (Eduardo Minett).

Desde o início, Eastwood aposta em um ritmo cadenciado, favorecido pelos montadores Joel Cox e David S. Cox e o roteiro nada apressado de Nick Schenk e do próprio N. Richard Nash, que toma liberdades para alterar importantes detalhes da história. Por boa parte da rodagem, não há a tensão de perseguições nem a ameaça da violência, permitindo que o relacionamento de Milo e Rafael se desenvolva de maneira bastante leve e descompromissada. Para os fãs do ator, existe aqui uma oportunidade de vê-lo sob outra luz, mas com a suavidade de sempre. 

As interações entre Milo e Rafael são marcadas por uma série de perguntas e indagações, reforçando o aspecto da descoberta pela qual os dois passam. Acompanhados pelo galo de briga do garoto, Macho, eles viajam de local em local encontrando alguns obstáculos mas também portos seguros, onde felizmente têm tempo para respirar. É nestes seletos momentos que Cry Macho demonstra suas maiores forças, em um ritmo relaxado que descarta qualquer possibilidade de melodrama. 

Quando quer evocar tensão a partir dos policiais federais e capangas que vão atrás de Rafael, o filme já não tem tanto sucesso. Não é uma obra particularmente enérgica, e nem quer ser, porém não há ameaça o suficiente para causar qualquer tipo de preocupação. Os obstáculos são facilmente superados, e isso deixa o longa relativamente frouxo em sua estrutura, procurando por divagações no tempo que resta. Eastwood e os roteiristas nem sempre encontram maneiras de preencher os intervalos entre essas ocasiões.

O que ajuda o longa a manter-se de pé são os diálogos vez ou outra espirituosos. “Não sei curar velhice”, diz Milo quando lhe pedem para ajudar uma mulher com seu velho cachorro, indicando sua relação de indiferença com a mortalidade. Em outras ocasiões, Milo questiona o ideal de masculinidade. “Essa coisa de macho não é tudo isso. Você deixa um touro te pisotear, um cavalo te arremessar por 15 metros. Que idiotice.” Outro instante ele interage com uma garota surda, satirizando com linguagem de sinais a ideia de ser macho. Momentos como estes são preciosos.

Com essa proposta de desconstrução, Cry Macho é uma agradável maneira de rever Clint Eastwood, agora com mais de 90 anos nas costas. Não imagino que seja a última vez que o veremos, dado o vigor que possui para comandar suas próprias obras e estrelá-las. A obra também indica que o realizador está mais pronto do que nunca para olhar seu próprio legado, e comentar sobre sua identidade como um símbolo de masculinidade, com prontidão para analisá-la e desmontá-la. 

Caio Lopes

Formado em Rádio, TV e Internet pela Faculdade Cásper Líbero (FCL). É redator no Cinematecando desde 2016.