Crítica: Lizzie
A angústia da submissão
Não é sempre que vemos o cinema trazer um recorte de um célebre tema ou acontecimento de maneira tão particular, buscando elementos novos e maneiras mais profundas de emocionar o público. É curioso que muitos de nós já conheçamos o caso da tão famosa Lizzie Borden, mas o filme Lizzie consegue contar uma história específica de amor e angústias passadas pela personagem, que poucos jamais imaginariam.
Durante a segunda metade do século XIX, Lizzie Borden (Chloë Sevigny) vivia com seu pai, sua madrasta, e sua irmã. Mas o que quase ninguém sabia é da presença da serviçal Bridget “Maggie” Sullivan (Kristen Stewart), que foi a única pessoa da casa que de fato procurou compreender e ajudar Lizzie. Em meio a tanto autoritarismo de seu desalmado pai, Lizzie se vê presa em um ambiente cheio de mentiras, e submissa aos homens de maneira absurda (como de fato era com todas as mulheres naquela época). Isso e outros acontecimentos revoltantes é que culminam em um dos crimes que mais chocou a América por muitos anos.
Em passos curtos e poucos diálogos, o roteirista do filme, Bryce Kass expõe o cotidiano de Lizzie em seu conturbado ambiente familiar. Com isso, traz à tona os surtos/apagões de Lizzie para nos acostumar com a personalidade e condições da mesma. A história nos coloca facilmente contra o pai de Lizzie e toda a subordinação que envolve as mulheres da casa, nos fazendo criar empatia por Lizzie e Maggie, assim como faz sentir na pele os horrores passados por ambas dentro da casa. Isso abre espaço para que o espectador questione, do começo ao fim, se Lizzie teve ou não “culpa” de ter feito o que fez, ainda que no fundo saibamos a resposta.
Tudo aqui é muito cuidadoso, pois a direção de Craig William Macneill permite nos jogar em uma experiência absorvente e sombria ambientada pela significativa mise-en-scene e ações dos personagens que dizem mais que palavras, além de uma caprichada composição de figurinos, objetos de cena e construções de cenário. Mas os maiores responsáveis pelo clima de suspense dramático do filme são provavelmente a fotografia soturna de Noah Greenberg, com iluminação natural e luzes baixas, os cortes precisos da montagem de Abbi Jutkowitz, que concede maior duração aos planos, e principalmente a trilha musical de cordas estridentes composta por Jeff Russo, que criam a angustia necessária para nos causar desconforto.
Apesar de algumas cenas desnecessárias e personagens que pouco acrescentam a trama, Lizzie emociona e nos faz sentir a inquietude de personagens femininas sem liberdade e sem a chance de serem felizes. Passados os 105 minutos de filme, sentimos vontade de conhecer melhor sobre Lizzie Borden, tanto antes quanto depois dos crimes. E para nossa sorte, a cultura pop está recheada de informações sobre a mulher, inclusive por meio de outros filmes e séries.